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Diferenças
Foram inúmeras as “Irenes” desse tempo, preparadas para enfrentar as vicissitudes da vida e por isso apetrechadas para lutar e levar de vencida a adversidade… e bem assim os “Jorges”, marionetas insufladas à procura de protagonismos balofos ancorados em filosofias que não entendiam e muito menos praticavam, parasitas que orbitavam os “aprendizes de feiticeiro” que, infelizmente, venceram e se tornaram nos mágicos que transformaram um País na “anedota” que hoje somos.
Infelizmente, para mim, a experiência colonialista foi contrária à citada no teu texto. Fiz a guerra colonial numa província onde, assim que coloquei os pés em terra firme, no porto marítimo da Beira, senti, por parte dos chamados colonos, o ódio da recepção ao ponto de proferirem, cara a cara, sem pejo e respeito o seguinte apupo:
Não classifiquei, na altura, este desabafo por parte de “brancos” locais. Talvez que tipos destes fossem apenas excepções, só que tive o azar de permanecer alguns dias por estas “bandas”, antes de continuar viagem para o meu destino final, e continuei a verificar que afinal não eram excepções. Recordo um primeiro sargento que comigo viajou e, não aguentando mais apupos do género, outros piores, viajou de regresso à Metrópole, preferindo ser preso por deserção a continuar num ambiente onde era hostilizado.
Confesso que durante muitos anos o meu sentimento para com os chamados “retornados”, não foi de pesar ou dó mas de indiferença, só modificado quando tomei conhecimento dos verdadeiros perdedores dos actos levianos dos nossos políticos de então que pretendiam, e assim conseguiram, o poder instalando o anarquismo, dividindo para governar.
Ainda está para contar o que se passou e isso não acontecerá enquanto forem vivos os causadores de estas e outras situações bem mais graves.
Ainda falta saber o que aconteceu aos milhares de nativos que lutaram envergando a nossa farda e desfraldando a nossa bandeira. Sabemos, por portas e travessas, que muitos, demasiados, foram passados pelas armas em execuções sumárias pois temos por experiência conhecedora que o racismo era mais acentuado entre eles do que de nós para com eles e vice-versa.
Por alturas desta tua estória da Irene e do Jorge, ninguém elucidou “os Jorges”, nos ambientes que eles frequentavam, até porque isso não convinha, que os tais colonialistas não habitavam África pois gozavam a vida, à custa dos usufrutos que de lá retiravam, em cidades Europeias, Paris, Londres, etc. Aqueles que regressaram, outros emigraram, foram empregados dos primeiros e apenas recebiam ordenados como qualquer trabalhador e viram as suas vivências interrompidas regressando, muitos deles, com uma mão à frente e outra atrás e por cá tiveram de retomar a luta do dia a dia num ambiente confuso e hostil.
Não quero alongar-me mais. Escreveste um texto bem elucidativo da diferença entre “colonialista” e meros “retornados”, estes fizeram-se à sua custa, com trabalho, suor e lágrimas, aqueles à custa do trabalho destes.
Um abraço
A.Justiça
COMENTÁRIOS
Inês F disse:
Por estes dias no blog o tema é ‘quente’. Apesar dos anos que passaram, a colonização e a descolonização das províncias ultramarinas continuam “encaixotadas” no porão dos nossos pesadelos.
Trazer para a luz do dia os retratos da época colonial, com os diferentes ângulos de visão, autenticados por quem viveu por dentro essa época, parece-me simples e lógico.
Está mais que na hora de exorcizar os fantasmas e arejar os pesadelos. Antes que a peça termine e se apaguem as luzes desta nossa ribalta.
Inês
Guida disse...
Gostei muito deste texto e da sinceridade com que foi escrito. Bem hajas Alfredo.
João Ramos Franco disse...
Algumas das razões que me levam a não me alargar nas palavras sobre o que se passou em Angola, durante a guerra colonial, são aqui ditas pelo Alfredo Justiça, mas muito mais há para contar...João Ramos Franco
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Luisa disse...
Este é um depoimento muito sincero,muito do fundo do coração.Gostei muito de ler mas não estou de acordo com tudo o que ele diz.Mas é da discussão de pontos de vista diferentes que nasce a luz,não é?Luisa
Não refere a data em que tal facto aconteceu. Se foi em 1975, talvez encontre explicação para a recepção que teve. Eu estava em Angola na altura, às voltas com o meu repatriamento e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no periodo de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam.
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Anónimo disse...
Gostaria que o Sr. Reboleira esclarecesse quais são os direitos,beneficios fiscais e outros que os ex-combatentes (não antigos)usufruem.
Não sei quem é o PC (personal computer ou Partido C... tanto faz). No entanto atendendo a que o pedido é exposto de maneira educada, vou tentar de forma abreviada focar os aspectos mais relevantes a que os Antigos (repito Antigos) Combatentes têm direito no Canadá.
Antes de continuar devo mencionar que neste país o serviço militar é voluntário, logo todos os que nele entram são profissionais, que não era o caso no nosso tempo. No meu caso, em 1974 na Europa e entre Outubro e Dezembro na zona de Nambuangongo, mais propriamente no Quixico, e depois em 1975 mais 9 meses em Luanda de onde regressei a um mês da Independência.
Voltando ao caso concreto do Canadá, sendo profissionais todos os militares, normalmente estão no activo durante 25 anos, passando depois à Reserva até aos 65 anos. Em termos de IRS, têm isenções próprias, que não poderei enumerar neste curto espaço. E na parte final da existência existem inúmeras instituições de Apoio e Assistência (aí chamam-se Lares), que apenas e exclusivamente aceitam antigos combatentes.
Voltando à definição de antigo ou ex-combatente, os únicos ex-combatentes que recebem pensôes são os que voltaram incapacitados dos diversos teatros de guerra onde o Canadá sempre esteve envolvido, normalmente como Capacetes Azuis, logo tanto poderá ser nas Honduras, ou no Haiti, como no Iraque, ou no Afeganistão. Só aqui já faleceram, creio 142 canadianos desde o inicio das operações, sendo os feridos contados por largos milhares.
Como a esposa do meu filho mais velho tem um familiar que regressou sem uma perna, sei do que falo e posso afirmar, que a pensão que recebe aos 29 anos é mais que suficiente para dar uma vida digna à esposa e aos filhos.Mas enfim, entrar neste campo é comparar algo que não tem comparação. Eu por exemplo, como estive 12 meses em zona operacional em Angola, fiz o pedido da tal pensão do Portas à qual julgava ter direito quando chegasse aos 65 anos. A resposta veio célere e sem direito a recurso: - O senhor como nunca trabalhou em Portugal, e vive fora do espaço da União Europeia, não tem direito a nada. Isto passou-se há cerca de 2 anos, honestamente não sei se esta regra do «viver fora da Europa» continua a ser válida, mas se fôr, lá temos mais uma daquelas leis feitas sobre o joelho, tão bizarra é a situação. Para terminar devo dizer que neste momento não estou absolutamente nada preocupado com isto, mas não haverá por aí muitos antigos combatentes na mesma situação a quem eventualmente essa pequena ajuda poderia ser útil ?
PS: li o comentário do Jorge Nicola e a resposta do Justiça. Como em 1975 estava em Luanda posso afirmar que, infelizmente, os dois têm razão. Quanto à ética de alguns dos nossos graduados, nem tudo eram rosas meu caro. Tive conhecimento duma cena no quartel do GAC 1 no bairro Alvalade em Luanda, em Setembro de 75 (pobre da moça) protagonizada por soldados é certo, mas os graduados ali mesmo ao lado nada fizeram para a interromper. Era a guerra afinal. Todas as guerras têm destas coisas, e na altura ainda não havia câmaras digitais em tudo o que é sítio, para passar as imagens cá para este lado no dia seguinte.
Um destes dias trarei para aqui (estou na fase mais ocupada do ano, no meu trabalho) uma resenha do que foi a existência de um furriel vague-mestre em Luanda entre Janeiro e Outubro de 75.
Amigo! Entrei por acaso neste blog e me interessou muito o que escreveste sobre "Os retornados da África". Sou brasileira,professora de História e gostaria muito que se vc pudesse escrever algo sobre o Brasil précolonial e Colônia dos portugueses, na visão do europeu, o que você acha?
10 comentários:
Gostei muito deste texto e da sinceridade com que foi escrito. Bem hajas Alfredo.
Algumas das razões que me levam a não me alargar nas palavras sobre o que se passou em Angola, durante a guerra colonial, são aqui ditas pelo Alfredo Justiça, mas muito mais há para contar...
João Ramos Franco
Este é um depoimento muito sincero,muito do fundo do coração.Gostei muito de ler mas não estou de acordo com tudo o que ele diz.Mas é da discussão de pontos de vista diferentes que nasce a luz,não é?
Luisa
Este tema ainda é muito sensìvel. Parece haver duas formas de «ver» a Guerra Colonial. A daqueles que a fizeram e a dos outros, que a leram pelos jornais ou outros meios de comunicação.
A mim o que me custa mais no nosso país, é a tentativa de branquear todo o processo. Penso ser devido ao facto de viver há mais de trinta anos num país onde os antigos combatentes têm direitos consagrados na lei fundamental do país, a beneficios, fiscais e outros, que vão muito além das propostas que Portas apresentou. Afinal, hoje como ontem, a ignorância continua a copmpensar!
Amigo! Entrei por acaso neste blog e me interessou muito o que escreveste sobre "Os retornados! da Àfrica. Sou brasileira,professora de História e gostaria muito que se vc pudesse escrever algo sobre o Brasil précolonial e Colônia dos portugueses, na visão do europeu, o que você acha?Ficarei muito grata, ok? Grande abraço!
Dany Mative
Não refere a data em que tal facto aconteceu. Se foi em 1975, talvez encontre explicação para a recepção que teve. Eu estava em Angola na altura, às voltas com o meu repatriamento e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no periodo de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam. Cordiais cumprimentos. Jorge Nicola
Resposta ao comentário de Jorge Nicola.
Estive na guerra em Angola, de Dezembro de 1964 a Maio de 1967, e como miliciano, fico um pouco espantado quando me falam sobre o comportamento dos militares. Não sei se na guerra alguma vez sentiu a raiva, ódio e muito outros sentimentos, que debaixo de fogo me passaram pela cabeça… disparamos e nada vimos na nossa frente, apenas ouvimos as balas que vêm em sentido contrário…há uma verdade, matamos sem ver.
Não gosto de falar nestes assuntos e muito menos dos escrever, sei que na guerra acontece tudo o que não gostamos, vimos camaradas que por o sistema nervoso já não suportar, cometem actos que naturalmente nunca os fariam…
Se a algum de vocês após lhe matarem um soldado foi obrigado a avançar (debaixo de fogo inimigo) sobre um acampamento guerrilheiro e consegui ver as caras de para quem estava a disparar, deve sentir a consciência pesada.
Nestas frentes de combate passaram factos que nunca deviam ter-se passado, mas que moralidade existe em falar das histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no período de 1974-75 até à sua independência.
Não arrisco a condenar qualquer facto só pelo que se dizia, sei o que é ter de tomar atitudes, não porque me tivessem feito mal a mim directamente mas por o terem feito aos meus soldados.
Por favor, vou a caminho dos 68 anos, poupem-me com as histórias que corriam e falem-me da verdade dos factos passados.
Penso que deixei esclarecido o Jorge.
Um abraço, do amigo
João Ramos Franco
Gostaria que o Sr. Reboleira esclarecesse quais são os direitos,beneficios fiscais e outros que os ex-combatentes (não antigos)usufruem.
Antecipadamente grato.
PC
Ainda 1975
Amigo Jorge Nicola, se tivesse acompanhado o Blog saberia que estive na guerra colonial em Moçambique nos anos 1971, 1972 e 1973 e que fiz a comissão em Mueda, Cabo Delgado, Planalto dos Makondes, fronteira com a Tanzânia.
Por outro lado a farda não se veste, enverga-se, e usa-se com orgulho e devoção pátrio que, parece, é coisa que hoje não se sabe bem o significado. O ambiente de guerra existente em Angola era bem diferente do de Moçambique pois em Luanda era mesmo “ali ao lado” enquanto que Lourenço Marques estava a mais de mil kilómetros e os combates só aconteciam de Nampula para cima, norte, ela nunca veio para sul e as evacuações em helicópteros, de feridos e mortos, não sobrevoavam estas cidades pelo que, até sobre este aspecto, estas cidades eram poupadas ao flagelo não só da guerra como, bem pior, psicologicamente.
Não direi que o desconhecimento, na capital, sobre o que se passava “nas zonas quentes” era total mas as noticias eram bem filtradas, só assim se percebe o porquê da proibição do uso de camuflado e bem assim o uso de trajo civil aquando qualquer estadia nestas cidades do sul, se não estivéssemos de serviço.
Só que ninguém avisou “os checas”, quando desembarcamos no porto da Beira, que o deveríamos fazer à civil e não fardados, com a agravante de ostentarmos divisas amarelas nos ombros transformando-nos assim em responsáveis e ofensores à boa harmonia, paz e tranquilidade de um burgo que tinha uma vaga ideia de que, talvez, a mil kilómetros lá mais para norte se travassem combates de vida e morte, na tentativa de travar a ascensão comunista evitando que estes tomassem conta de território avesso a este regime politico.
Recordo que, anos mais tarde, muitos anos mesmo, em conversa com amigos, alguns deles com cerca de 80 anos de idade, disse que, numa incursão que fiz ao cemitério de Mueda ainda lá estavam campas de militares que tinham morrido durante a segunda guerra mundial, na defesa da fronteira norte de Moçambique contra os alemães. Passei por mentiroso fantasista porque o país não tinha entrado nessa guerra e por conseguinte não houve mortes. Fiquei atónito a olhar para as pessoas que me contradiziam. Será que pensam que durante 500 anos só nesta época, a da guerra colonial, é que foram enviados militares defenderem as províncias ultramarinas?... mas depois caí em mim e lembrei-me do tabu em volta da vivência, não secreta, mas muito restrita, do que por lá acontecia.
Por isso, amigo Jorge, não acredite em tudo o que, os interesses instalados, fizeram circular em Luanda no ano de 1975. Não saio em defesa ou repúdio para a sua frase “e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no período de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam.” Não estava lá, nem em Angola nem em Moçambique, para aquilatar o ambiente vivido mas dificilmente me convencem que homens, especialmente furriéis, alferes, tenentes e capitães, enfim os milicianos, homens com conhecimento e cultura acima da média se comportassem fora de ética que desde os bancos da escola nos foi ensinada.
Um abraço
A.Justiça
Não sei quem é o PC (personal computer ou Partido C... tanto faz). No entanto atendendo a que o pedido é exposto de maneira educada, vou tentar de forma abreviada focar os aspectos mais relevantes a que os Antigos (repito Antigos) Combatentes têm direito no Canadá.
Antes de continuar devo mencionar que neste país o serviço militar é voluntário, logo todos os que nele entram são profissionais, que não era o caso no nosso tempo. No meu caso, em 1974 na Europa e entre Outubro e Dezembro na zona de Nambuangongo, mais propriamente no Quixico, e depois em 1975 mais 9 meses em Luanda de onde regressei a um mês da Independência.
Voltando ao caso concreto do Canadá, sendo profissionais todos os militares, normalmente estão no activo durante 25 anos, passando depois à Reserva até aos 65 anos. Em termos de IRS, têm isenções próprias, que não poderei enumerar neste curto espaço. E na parte final da existência existem inúmeras instituições de Apoio e Assistência (aí chamam-se Lares), que apenas e exclusivamente aceitam antigos combatentes.
Voltando à definição de antigo ou ex-combatente, os únicos ex-combatentes que recebem pensôes são os que voltaram incapacitados dos diversos teatros de guerra onde o Canadá sempre esteve envolvido, normalmente como Capacetes Azuis, logo tanto poderá ser nas Honduras, ou no Haiti, como no Iraque, ou no Afeganistão. Só aqui já faleceram, creio 142 canadianos desde o inicio das operações, sendo os feridos contados por largos milhares.
Como a esposa do meu filho mais velho tem um familiar que regressou sem uma perna, sei do que falo e posso afirmar, que a pensão que recebe aos 29 anos é mais que suficiente para dar uma vida digna à esposa e aos filhos.
Mas enfim, entrar neste campo é comparar algo que não tem comparação. Eu por exemplo, como estive 12 meses em zona operacional em Angola, fiz o pedido da tal pensão do Portas à qual julgava ter direito quando chegasse aos 65 anos. A resposta veio célere e sem direito a recurso:
- O senhor como nunca trabalhou em Portugal, e vive fora do espaço da União Europeia, não tem direito a nada. Isto passou-se há cerca de 2 anos, honestamente não sei se esta regra do «viver fora da Europa» continua a ser válida, mas se fôr, lá temos mais uma daquelas leis feitas sobre o joelho, tão bizarra é a situação. Para terminar devo dizer que neste momento não estou absolutamente nada preocupado com isto, mas não haverá por aí muitos antigos combatentes na mesma situação a quem eventualmente essa pequena ajuda poderia ser útil ?
PS: li o comentário do Jorge Nicola e a resposta do Justiça. Como em 1975 estava em Luanda posso afirmar que, infelizmente, os dois têm razão. Quanto à ética de alguns dos nossos graduados, nem tudo eram rosas meu caro. Tive conhecimento duma cena no quartel do GAC 1 no bairro Alvalade em Luanda, em Setembro de 75 (pobre da moça) protagonizada por soldados é certo, mas os graduados ali mesmo ao lado nada fizeram para a interromper. Era a guerra afinal. Todas as guerras têm destas coisas, e na altura ainda não havia câmaras digitais em tudo o que é sítio, para passar as imagens cá para este lado no dia seguinte.
Um destes dias trarei para aqui (estou na fase mais ocupada do ano, no meu trabalho) uma resenha do que foi a existência de um furriel vague-mestre em Luanda entre Janeiro e Outubro de 75.
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