ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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JANTAR DE PROFESSORES EM 1971

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JJ disse:
Ao contrário dos alunos, os professores do ERO não esperaram sair do colégio para organizar uns almoços e jantares entre si, esquecendo obviamente o proletariado estudantil, que não tinha direito a nada...
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Já aqui publicámos fotografias de jantares de Natal, estas são do final do ano lectivo de 1970/1971.
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Inês respondeu:
O dito proletariado estudantil tinha o direito de viver totalmente entregue à sua adolescência, e nem precisava de jantar... enquanto os professores apenas petiscavam o magro convívio dos intervalos, que lhes abria o apetite para uma ceia mais formal.
Imagino um mistério nesta sequência fotográfica, um sentido futurista. “Um dia, daqui a muitos anos, vamos voltar a encontrar-nos num sítio virtual, numa nave especial chamada blogue. Tal qual estamos, tal qual somos. Sorriam pois!”
E em cada foto me parece que se falou de um futuro chamado blogue, mas que ninguém acreditou. Porém, sorriu!
E afinal era verdade!
BJ, JJ
Inês
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Isabel Xavier legendou:
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É bom rever tanta gente amiga e marcante da nossa juventude, agora que já todos somos "velhotes"! E que bom aspecto tinham! Não é por acaso que a Ana Vieira Lino ganhava todos os anos o prémio "Miss Casino"! Eu votava sempre nela.
. 1ª - Dra. Inês; D. Rosa; Ana V. L.; D. Clarisse.
2ª - D. Esperança (em parte); Dr. Serafim; D. Clarisse.

3ª - Dra. Noémia; Dra. Júlia; Dra. Inês; Drª Cristina.
4ª - D. Esperança; D. Anita; Dra. Inês; Dra. Margarida.

5ª - Dr. Lopes; Elisa Maria; Dra. Deolinda; D. Dora.



6ª - Madame Nicole; Drªa Inês; Dra. Deolinda; D. Dora.



7ª - Ana V. L.; Dra. Noémia; Dra. Júlia.

8ª - Dra. Margarida; Dra. Deolinda (de pé); D. Anita; D. Rosa (de pé);
D. Esperança (a levantar-se); por trás, Sr. Faria e Padre Renato (ou parte dele).

9ª - Ana V.L.; Dra. Noémia; (?); Dra. Inês; Elisa Maria; Dr. Lopes.
Quem será "?"? O marido da Dra. Inês? Não sei, não o conhecia. Como aparece a seu lado... ponho essa hipótese.Bjinhos
- Isabel Xavier -

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miniprofa disse...
Isabel Xavier
Acertou! É mesmo o meu marido, Luís Filipe.
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António José Lopes disse:
Que bom voltar ao passado, quase 40 anos nos separam destes “flashes”.
De notar que não eram assim tantos os jantares, apenas três por ano lectivo. No inicio do ano, antes de começarem as aulas e após uns dias de reuniões preparatórias, pelo Natal e a despedida no início das férias.
Foi sem dúvida o melhor período da minha vida, um tempo que recordo com saudade, acho que gostei mesmo de ser professor. Foi uma grande aventura. Em 71 já estava prestes a deixar o ensino para embarcar noutras aventuras. Olho para as fotos com “mixed feelings”a alegria das boas recordações contrasta com a tristeza de recordar os que já partiram.
Um abraço A.J.F.L.
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Luisa disse:
Alguém tem alguma informação sobre a Júlia e a Noémia? Um contacto, telefone ou morada?Nunca mais soube nada delas.Gostei muito de ver aqui estas fotografias!Luisa
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Anónimo disse...
A Dra. Noémia Félix faleceu nos finais de 2009.
A Dra. Noémia Félix, ainda que alentejana de nascimento, vivia há muitos anos na Portela de Loures e estava reformada do ensino secundário.
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António disse:
Realmente a Julia,a Noémia,a Ana Vieira Lino,a Helena,nunca vieram ao nosso encontro.Das professoras desse tempo só a Inês nos deu o prazer da sua companhia.Não há contactos delas?
Percebo que não se possa fazer um blogue só de fotografias mas estas dão sempre muito prazer a ver...Obrigado,abraço.
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NANI BAROSA


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Faleceu na Suiça,onde residia,a nossa antiga colega Nani Barosa.Lembro-me de uma adolescente alegre e travessa,mas outros a conheceram melhor que eu. Aqui ficam os testemunhos de alguns deles. JJ


NANI



O irmão, a mãe e o pai da Ana Barosa gostariam que constasse no vosso site, Antigos Alunos ERO, a mensagem que foi lida no funeral da Ana Barosa ( Nani) feita pelos seus superiores e colegas na Aicep e Turismo de Portugal em Zurich.
Muito Obrigado.
Armando, Ivone e Armando jr


Ana Barosa

Estamos aqui hoje todos reunidos para acompanhar a nossa ANA no seu último caminho. É muito difícil aceitar que a ANA já não está entre nós, é muito difícil para nós como colegas ver a sua mesa vazia….

A ANA vai permanecer nos nossos corações não só pela excelente profissional que sempre foi mas e sobretudo pelo ser Humano Excepcional e tão Querido, a todos aqueles que tiveram o privilégio de a conhecer. Nutrimos pela ANA a maior admiração pela sua coragem e forma positiva como viveu cada dia da sua vida. Ana teve sempre o carinho e apoio da filha, dos pais e do irmão e para eles vão as nossas profundas condolências. Na nossa memória ficará para sempre o seu riso aberto e amigável….

Em nome da AICEP e do TURISMO de Portugal queremos dizer à nossa colega e amiga muito obrigada, pela dedicação ao trabalho, pela boa relação com os colegas e todas as pessoas com quem privou a sua vida profissional e pessoal.

Que descanse em PAZ.
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NANI (Lena Figueira)
Maria Helena Figueira

Conheci a Nani muito bem. Andava na minha turma e lembro-me dela andar sempre (ou quase sempre) acompanhada pela Salete. Fiquei com imensa pena e mais ainda por nunca mais ter tido algum contacto com ela. Ainda cheguei a vê-la na faculdade de Letras (se bem me lembro..) no primeiro ano mas nunca mais a vi. A minha vida passou a ser sempre em Lisboa e fiquei sempre com uma certa nostalgia do tempo do E.R.O. das Caldas onde estudei desde o meu 2ºano até ao 7ºano. Foi um bom tempo com muito boas recordações!! No blogue fiquei a saber que a Nani era uma pessoa muito admirada e fantástica. Tenho muita pena de não ter continuado a conviver com ela!...

to Switzerland with love
à janela (Inês Figueiredo)


NANI BAROSA (por Natália Pires)
Como amiga "no mundo" (como ela me dizia), não podia deixar de vos dizer que a cerimónia do funeral da Nani em Zug foi duma grande beleza e plena de emoção. À maneira Suiça, e na presença da urna com cinzas,houve música, leitura de poemas e leitura de textos e improviações de vários amigos e colegas. Não estive presente, por ter optado estar com ela no dia do seu aniversário, a 3 de Março, mas foi-me transmitido pelos pais, numa amálgama de desgosto e orgulho, o que esta cerimónia veio mais uma vez demonstrar - o quanto a Nani foi importante e especial para tanta gente. A seu pedido, as cinzas virão para Portugal e serão espalhadas nas areias da Foz do Arelho. E aí, continuará sempre connosco! Gostaria agora de responder pela Nani ao José Luis Alexandre sobre o livro de que falava "Train de Nuit pour Lisbonne". Ela leu-o, gostou muito e recomendou-mo. Tenho comigo a anotação do nome para o comprar e vou fazê-lo brevemente. Natália Pires

NANI (Libãnia)
Libania Lewis

Lembro-me da Nani, o seu sorriso atraente e maroto, cheia de energia, sempre simpática. Não éramos chegadas, ela um pouco mais velha que eu, no entanto era o tipo de pessoa que uma vez que se conhece nunca se esquece.

A BOLINHA (Carmo Franco)
Foi a minha melhor amiga nos primeiros anos do Colégio. Eu
era a “Barata Loira”, ela era a “Bolinha”, a Natália o “Parafuso”. Já não me lembro das razões destes cognomes que nos foram dados pelo P. António Emílio mas não acho que isso agora seja importante.

Nunca me esquecerei das tardes que passei em casa dela a ouvir os discos do Raúl Solnado do pai dela e também dos papo-secos quentinhos que lanchávamos à sexta-feira ou sábado quando o padeiro chegava a casa à tarde com a cesta do pão para o fim-de-semana. São tantos os momentos que me vêm à lembrança!

Entretanto acabámos por perder o contacto. Soube notícias dela há 2 ou 3 anos pelos pais que encontrei casualmente e a quem envio um grande abraço de solidariedade. Quanto a ti, amiga, um até sempre!... Estiveste e ficarás para sempre na minha memória.

Carmo Franco (hoje Carmo Lemos)


Olga Pereira Estou muito ,muito triste ,a minha amiga Nani,já não nos vai escrever as suas lindas e sentidas palavras.Fomos amigas não só do colégio mas desde que nascemos.Brincámos de pequeninas e mesmo agora,eu em Portugal e ela na Suíça ambas trabalhávamos para a mesma Instituição.Sempre a recordarei com saudade . Que descanses em Paz ,querida amiga. António José Figueiredo Lopes: Fiquei muito chocado ao saber do falecimento da Náni. Lembro-me bem da jovem alegre e feliz que era, e que depois, como muitos deixei de ver… para voltar a encontrar no “Blog”. Soube hoje que já estaria doente com gravidade há algum tempo. O pai que conheci bem em jovem, embora um pouco mais velho do que eu, penso que ainda estará para os EUA. Coloco uma interrogação sobre o funeral--- dia 21 quarta? Será que o funeral é cá? Um abraço A. J. F. Lopes Resposta: O corpo da Nani será cremado na Suiça; não está pois prevista qualquer cerimónia fúnebre em Portugal.

Salette Saraiva :

O funeral da Nani será na 4ª f , dia 21 de Abril. Há um mundo de coisas a dizer sobre a Nani. Um profundo amor á vida , aos seus , a enorme alegria , a entrega , o empenhamento e cuidado que dedicava a todos e a tudo.Era diferente e não deixava ninguém indiferente. Soube viver de uma forma extremamente participativa , atenta , solidária . Era muito inteligente e lúcida . Voluntariosa ,generosa , criativa , envolvente. Foi uma Amiga extraordinária.Deixa-me muita ,muita saudade. Agora não….mas mais tarde talvez me seja possível falar mais sobre ela. BeijinhoSalette Amélia Teotónio : Apesar de ser bem mais nova lembro-me perfeitamente da Nani e daquele seu bonito sorriso.Sinto um grande pesar pela sua partida.É mais um membro da família ERO que nos deixa...




Não conheci a Nani.Contudo,não posso deixar de sentir o que nestas ocasiões não se sabe exprimir. Cada colega que "parte", deixa-nos de luto.


Ana Nascimento : Oh que tristeza senti ao saber da tua partida miúda... pena de não ter falado contigo e de te poder dar um abraço . Ficou o teu sorriso e essas covinhas marotas ... Deus te guarde Nani , beijinhos


Laura Morgado : Não convivi com a Nani, mas não deixo de ficar com muita pena! Cada colega que parte é um vazio que fica!Tal como diz a Manuela, ficamos de luto.


Maria Do Rosário Pimentel : Não há palavras...!Estamos de luto. Anabela Miguel : Que tristeza ao abrir o blog e deparar-me com a foto da Nani com a notícia da sua morte. Convivemos em pequeninas e mais tarde no colégio. Onde quer que estejas miúda um grande beijinho de muita saudade.




Não partiu sem nos deixar uma despedida. Uma saudade.



Lamento a perda, mas a nani não estava nos eua , ha muitos anos que nao sabia dela.



A Nani fazia parte da nossa Familia do ERO! Não há palavras que descrevam a perda de alguém....que descanse em Paz e ficamos com a imagem do seu soriso.



Muito triste... I


Inês Figueiredo :
'tristeza não tem fim, felicidade sim' Um beijo, Zé Carlos Diria que a Nani 'faz' parte da nossa Família do ERO. Graças ao blog, continua presente no mundo virtual.


Jose Luis Alexandre : Dificil abrir o Blog e deparar-se com uma frase tão triste a acompanhar uma foto que, toda ela ,é beleza e felicidade. Não conheci a Nani, mas ainda um dia lhe vou perguntar: - Afinal miúda, chegaste a ler Train de Nuit pour Lisbonne ?


ana lucia : Para a familia da Nani Barbosa os meus sentidos pêsames. Ana Lucia


Guida : Apesar de ser mais nova do que eu lembro-me muito bem da Nani Barosa. Sempre sorridente, alegre, simpática. Mais uma de nós que parte e deixa saudade. Lembra-nos que nada é eterno, tudo é fugaz. Adeus Nani.


JJ :

Respondendo a várias interrogações de colegas, informo que o corpo da Nani será cremado na próxima Quarta-Feira na Suiça; não está prevista, naturalmente, qualquer cerimónia fúnebre em Portugal.



A BOLINHA

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Foi a minha melhor amiga nos primeiros anos do Colégio. Eu era a “Barata Loira”, ela era a “Bolinha”, a Natália o “Parafuso”. Já não me lembro das razões destes cognomes que nos foram dados pelo P. António Emílio mas não acho que isso agora seja importante.
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Nunca me esquecerei das tardes que passei em casa dela a ouvir os discos do Raúl Solnado do pai dela e também dos papo-secos quentinhos que lanchávamos à sexta-feira ou sábado quando o padeiro chegava a casa à tarde com a cesta do pão para o fim-de-semana. São tantos os momentos que me vêm à lembrança!
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Entretanto acabámos por perder o contacto. Soube notícias dela há 2 ou 3 anos pelos pais que encontrei casualmente e a quem envio um grande abraço de solidariedade. Quanto a ti, amiga, um até sempre!... Estiveste e ficarás para sempre na minha memória.

Carmo Franco (hoje Carmo Lemos)


Não resisto a enviar um autógrafo que a Nani me deu no dia em que fiz 13 anos!... Naquela altura todos tínhamos livros de autógrafos.
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C O M E N T Á R I O S

Maria Helena Arroz disse...
Olá "Barata Loira"

O Padre António achava-vos muita graça porque vocês eram muito pequeninas e não paravam quietas a brincar. Já repararam no tamanho da Nani que vai de mão dada comigo na roda exterior? A nossa diferença de idade deve ser para aí de 3 ou 4 anos, mas a nossa diferença de altura, quando vocês chegaram ao primeiro ano, é incrível.Por isso é que eu, que era muito maternal e protectora, passava o tempo a pegar-vos ao colo. Depois a Nani vestia uns vestidinhos com muita roda e sempre a correr de um lado para o outro parecia uma Bolinha.Tu eras muito loirinha e tinhas uns caracolinhos muito engraçados.

Beijinhos

Lena Arroz, com saudades da Nani

AINDA 1975 (A. Justiça)

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Alfredo Justiça escreveu:
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Fiz a guerra colonial numa província onde, assim que coloquei os pés em terra firme, no porto marítimo da Beira, senti, por parte dos chamados colonos, o ódio da recepção ao ponto de proferirem, cara a cara, sem pejo e respeito o seguinte apupo:
- Que vens para aqui fazer? Terrorismo? Não precisamos cá de ti.
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Jorge comentou:
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Não refere a data em que tal facto aconteceu. Se foi em 1975, talvez encontre explicação para a recepção que teve. Eu estava em Angola na altura, às voltas com o meu repatriamento e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no periodo de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam.
Cordiais cumprimentos.
Jorge Nicola
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Alfredo respondeu:
Amigo Jorge Nicola, se tivesse acompanhado o Blog saberia que estive na guerra colonial em Moçambique nos anos 1971, 1972 e 1973 e que fiz a comissão em Mueda, Cabo Delgado, Planalto dos Makondes, fronteira com a Tanzânia.


Por outro lado a farda não se veste, enverga-se, e usa-se com orgulho e devoção pátrio que, parece, é coisa que hoje não se sabe bem o significado.

O ambiente de guerra existente em Angola era bem diferente do de Moçambique pois em Luanda era mesmo “ali ao lado” enquanto que Lourenço Marques estava a mais de mil kilómetros e os combates só aconteciam de Nampula para cima, norte, ela nunca veio para sul e as evacuações em helicópteros, de feridos e mortos, não sobrevoavam estas cidades pelo que, até sobre este aspecto, estas cidades eram poupadas ao flagelo não só da guerra como, bem pior, psicologicamente.

Não direi que o desconhecimento, na capital, sobre o que se passava “nas zonas quentes” era total mas as noticias eram bem filtradas, só assim se percebe o porquê da proibição do uso de camuflado e bem assim o uso de trajo civil aquando qualquer estadia nestas cidades do sul, se não estivéssemos de serviço.

Só que ninguém avisou “os checas”, quando desembarcamos no porto da Beira, que o deveríamos fazer à civil e não fardados, com a agravante de ostentarmos divisas amarelas nos ombros transformando-nos assim em responsáveis e ofensores à boa harmonia, paz e tranquilidade de um burgo que tinha uma vaga ideia de que, talvez, a mil kilómetros lá mais para norte se travassem combates de vida e morte, na tentativa de travar a ascensão comunista evitando que estes tomassem conta de território avesso a este regime politico.

Recordo que, anos mais tarde, muitos anos mesmo, em conversa com amigos, alguns deles com cerca de 80 anos de idade, disse que, numa incursão que fiz ao cemitério de Mueda, ainda lá vi campas de militares que tinham morrido durante a segunda guerra mundial, na defesa da fronteira norte de Moçambique contra os alemães. Passei por mentiroso fantasista porque o país não tinha entrado nessa guerra e por conseguinte não houve mortes. Fiquei atónito a olhar para as pessoas que me contradiziam. Será que pensam que durante 500 anos só nesta época, a da guerra colonial, é que foram enviados militares defenderem as províncias ultramarinas?... mas depois caí em mim e lembrei-me do tabu em volta da vivência, não secreta, mas muito restrita, do que por lá acontecia.
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Por isso, amigo Jorge, não acredite em tudo o que os interesses instalados fizeram circular em Luanda no ano de 1975. Não saio em defesa ou repúdio para a sua frase “e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no período de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam.” Não estava lá, nem em Angola nem em Moçambique, para aquilatar o ambiente vivido mas dificilmente me convencem que homens, especialmente furriéis, alferes, tenentes e capitães, enfim os milicianos, homens com conhecimento e cultura acima da média se comportassem fora de ética que desde os bancos da escola nos foi ensinada.

Analisemos :

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As guerras em Angola, Guiné e Moçambique não são comparáveis por vários factores que as distinguem mas principalmente porque:
1. A guerra em Angola despoletou-se em Luanda, a capital, e foi“empurrada” para o exterior da cidade na tentativa, conseguida, de a afastar desta metrópole transportando-a para províncias situadas a centenas de kilómetros. Anos depois a capital só tinha conhecimento da existência da guerra porque pelo seu espaço aéreo circulavam os helicópteros transportando os militares doentes, feridos ou mortos;
2. Na Guiné, igualmente estalou na capital, Bissau, e de lá estendeu-se a toda a região e a todo o País, nunca de lá saiu e nos anos vindouros continuou acesa e cada vez mais intensa devido,principalmente, ao empenho de países, ditos comunistas, mais oportunistas que comunistas, que forneciam, instruíam e instigavam à luta através da colocação no território de mais e melhor equipamento e armamento;
3. Em Moçambique as coisas passaram-se de forma diferente. A guerra colonial estalou em Mueda, mais propriamente no Chai, Província de Cabo Delgado, norte do País, e estendeu-se a Tete e Niassa, regiões situadas a mais de mil kilómetros da capital, Lourenço Marques e de outras importantes cidades, capitais de província, Quelimane e Beira, que da guerra apenas ouviam falar por alto e em noticias devidamente filtradas, e para que assim fosse a intensa permanência da policia politica para que não houvesse devaneios com estórias de combates, mortes e atitudes e feitos pouco dignificantes, mas naturais em toda e qualquer guerra. Todo e qualquer militar de licença nestas cidades estava terminantemente proibido de envergar o camuflado, muito menos transportar armas acima de corta-unhas. Aliás, deveriam de preferência, vestir “à civil”.Com esta “politica” as gentes destes burgos só de quando em vez,talvez, lhes viesse ao cérebro que havia uma guerra, guerra essa que,para além de outras motivações, os militares mantinham longe, lá para o norte, acima da capital militar, Nampula, nunca permitindo aexpansão para sul. Lutava-se, morria-se e evacuavam-se para o hospital da capital militar e dali saiam, os mortos devidamente encaixotados,de avião para a metrópole ou de barco, onde eram embarcados no porto de Nacala ou Porto Amélia não incomodando as boas gentes das capitais do sul.
“Bem vindos a Mueda, Terra da guerra, Aqui trabalha-se luta-se e morre-se”.Foi com estas palavras que cheguei a Mueda. Elas encontravam-se escritas num cartaz de boas-vindas colocado no arame farpado que delimitava a zona militar.

Foi já instalado há vários dias em Mueda que tomei conhecimento das“zonas quentes” e orientações da luta, nessa altura fazendo uma introspecção à memória recente, compreendi a atitude dos “colonos”brancos no porto da Beira. Para eles eu era o terrorista que ia fazera guerra… afinal nem sabiam o que se passava tal a eficácia da nossa acção em confinar a guerra no norte de Moçambique longe dos seus olhares e calada aos seus ouvidos.

Ignorantes é o mínimo presenteio que lhes posso dispensar. Com o passar do tempo perdoei-os. Afinal nada sabiam. Mas este magnânimo gesto não o dispenso aos muitos outros ignorantes que, após a Revolução dos Cravos, escamotearam com maléficas e insidiosas mentiras e artimanhas, - “… assassinos dos nossos irmãos negros” - com que fomos mimoseados, e que, de naturais heróis, passámos a proscritos da Nação.

E o “lindo” deste anedotário, tornaram-se nos potentados dirigentes de “massas” que dirigiram tão bem essas “massas”, e as outras massas,ao ponto de levarem o País à dependência de mingua. Da altivez e orgulho de uma Nação que deu Novos Mundos ao Mundo passamos à ridícula e vergonhosa “pedincha”.

Apesar de tudo continuo a gritar bem alto “Viva o 25 de Abril” mas acrescento… abaixo os que se aproveitaram da liberdade alcançada para vigarizar, roubar e enxovalhar este povo que continua puro e a ser com orgulho, simplesmente Português.

Um abraço

A.Justiça

C O M E N T Á R I O S

PLB disse...
Caro Alfredo Justiça: A alusão à segunda guerra mundial, em Moçambique, foi com certeza um lapso, na primeira guerra mundial é que tivemos que defender a fronteira norte de Moçambique dos alemães.

http://www.arqnet.pt/portal/portugal/grandeguerra/pgm_mocam02.html

http://www.arqnet.pt/portal/portugal/grandeguerra/pgm_mocam04.html

abraço. Pedro Bandeira

Inês disse:

Eu não fui à tropa... mas nem era preciso assentar praça para entrar na guerra. Vi partir primos, irmão, amigos, vizinhos. Escrevi aerogramas de adeus-até-ao-meu-regresso.
Em 62 partilhava a camarata com estudantes ultramarinas, a Leonete sonhava com as cores do pôr do sol na Ilha de Luanda e a Fernanda com as maravilhas da sua Inhambane. A guerra estava no início e não fazia parte das nossas conversas de caloiras. Como a Irene da sua história, elas tinham mentalidades bem abertas. A África dos grandes espaços tinha muito pouco a ver com o Portugal minúsculo e limitado.
Do 25 de Abril recordo sobretudo a frase "A guerra acabou!" gritada pelos rapazes. Até então desculpavam-se quando não estudavam com um desalentado "Não vale a pena, professora. Vamos ser carne para canhão."
Foi bonita a festa, pá!
Bj
Inês

ANGOLA, MARÇO DE 1966

.por João Ramos Franco
(em resposta a um comentário de Jorge Nicola)
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Angola, Março de 1966 – Negage – Sector de Carmona

Carmona, região onde a riqueza produzida depende, essencialmente, das Roças de Café.
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Encontro-me aquartelado na povoação do Negage, com a missão de reforço operacional à 3ª Companhia do batalhão de Caçadores de Carmona.
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São conhecidas nesta região como pontos nevrálgicos de aquartelamento dos guerrilheiros inimigos as Serras de Uige, Pingano, Quitoque, Mucaba e Quijoão.
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Em Março de 1996, após a tomada da base táctica nº 1 da Serra do Pingano, começámos a operar a partir daí para efectuarmos a operação de limpeza daquela serra.
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No mês seguinte à abertura da Base, devido à segurança da mesma e à extensão da serra, numa patrulha que o meu grupo faz deparáramos com mais um acampamento inimigo, que conseguimos tomar após forte oposição. Assegurada a tomada da posição e as devidas precauções prevenindo qualquer contra-ataque, comunicámos com a Base dando conta da situação, da qual recebemos ordem para aguardar porque iríamos ser substituídos por um pelotão de vinha da Companhia aquartelada em Zalala.
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Entre os despojos de combate é encontrado um cesto com correspondência trocada entre os guerrilheiros e os Senhores do Café em que é focada a necessidade de mais apoio na compra do café produzido no cimo da serra (chamado café de candonga), para a aquisição de armamento, principalmente.
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Passam-se talvez 15 dias depois deste achado e dá-se o meu regresso ao Negage. As viaturas param frente ao Quartel, do outro lado da rua é o clube dos senhores do café que também era frequentado por nós, eu dirijo-me ao para lá e sento-me à mesa com o Capitão (era capitão miliciano):
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- Então pá, ‘tás assim com tanta sede? Dêm aí um whisky! - diz o Capitão.
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Pouso o cesto com os documentos encontrados na serra sobre mesa, bebo o gole, e digo para o Capitão:
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- Lê isso que está no cesto e diz-me se é preciso ir matar para o cimo da Serra ou se começo já por aqui… (estavam muitos senhores do café presentes quando falei).
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Saí do clube com o Capitão e, ainda não tinham passado 24 horas, recebo ordem para arrancar para Kimariamba, a cerca de 300 quilómetros, junto da fronteira com o Congo…
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Sei que deveria ter descansado três dias, pelo menos, antes de ter recebido as ordens que recebi e tenho a certeza que não foi o capitão que comunicou o que eu disse ao Comando de Batalhão em Carmona … então quem foi?
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Sei que disseram:
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- Ele está louco, é um perigo.
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O que esta gente não sabia é que além de ter salvo a vida ao Capitão, já era amigo dele antes ir para a tropa. Não morri, que era o mais fácil de me acontecer em Kimariamba, e vim a saber exactamente tudo o que eles fizeram.
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João Ramos Franco
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C O M E N T Á R I O S
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Alfredo disse...
João Franco
Francamente até concordo com os senhores quando afirmam:
• Ele está louco, é um perigo.
E escapaste?!!! Regressaste são e escorreito?!!! Quer dizer… entras no “ninho das víboras” e dizes uma coisa dessas… assim, sem mais nem menos. Bem sei que quando se é novo a irreverência anda à flor da pele, mas nessa idade também já sabíamos que precaução e “caldos de galinha” nunca fizeram mal a ninguém. Cada um é como cada qual… e os rebates de fúria e indignação mostram-se das mais variadas maneiras. Essa foi uma maneira perigosa para a tua integridade física. Compreendo-a no entanto… afinal fomos enviados para tão longe para defender os bens destes “meninos” e estes traiam e… podes crer que vivem, actualmente, sem pesos de consciência… porque isso é coisa que não têm.
Não me alongo mais contando situações semelhantes passadas na outra província, banhada por outro mar, senão o JJ transforma-o em crónica quando o objectivo é somente comentar.
Um abraço
A.Justiça
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JJ disse:
Quero esclarecer, a propósito da "transformação" de que fala o Justiça no seu comentário, que a edição do Blog não faz alquimia... Este post, por exemplo, foi escrito como uma resposta a um comentário mas merecia claramente a atenção que normalmente se dá aos posts. O mesmo aconteceu com um texto do Alfredo Justiça, que estará aqui amanhã, e é por isso que ele se "queixa". A ele e ao João um obrigado por enriquecerem com os seus excelentes depoimentos pessoais este debate.
Um abraço. JJ
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Anabela disse:
Não tencionava intervir mais no tema "Guerra Colonial" mas, ao ler a resposta de João Ramos Franco a um comentário, não pude ficar indiferente.
Recordei uma conversa que o meu Pai teve sobre uma situação que os intrigava bastante, quando estavam a defender uma roça de café algures em Angola.O seu proprietário saía para a picada e nada lhe acontecia, mas logo que saía uma coluna militar era de imediato atacada pelos terroristas.Do que eles desconfiavam, mais tarde tiveram a confirmação - o dito Senhor estava conivente com os guerrilheiros.....Os seus bens a serem protegidos e a recompensa era a Traição!!!
Era só isto que eu queria dizer.
Um abraço
Anabela Miguel
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Inês F disse:
Por estes dias no blog o tema é ‘quente’. Apesar dos anos que passaram, a colonização e a descolonização das províncias ultramarinas continuam “encaixotadas” no porão dos nossos pesadelos.
Trazer para a luz do dia os retratos da época colonial, com os diferentes ângulos de visão, autenticados por quem viveu por dentro essa época, parece-me simples e lógico.Está mais que na hora de exorcizar os fantasmas e arejar os pesadelos. Antes que a peça termine e se apaguem as luzes desta nossa ribalta.
Inês
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Luis disse:
Extraordinário relato, com localização precisa da acção no Espaço e no Tempo e uma história interessante que constituiu,para mim, uma revelação de algo que desconhecia em absoluto!Tem razão a Drª Inês quando diz que falta saber muita coisa!Abraço e parabéns ao João Franco.Luis
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Joaquim disse...
Presentemente um dos meus "hobbies" é viajar até ao " blog" da E.B.Pinheiro e dar uma saltada até aos alunos do R. Ortigão.
Toda esta geração dos anos 70s (novos adultos), comparando com os anos 60s, já eu estava com o serviço militar cumprido e a uma grande distância do nosso querido Portugal.
O J.J. fala-nos duma (quase verdadeira) estória muito bem contada da Irene e do Jorge (certamente houve muitos Jorges e Irenes) após o 25 de Abril e eu confesso que gostei imenso, Nessa altura para mim existiam apenas as noticias de alguns ainda jovens jornais portugueses ou estações radiofónicas "escassas" a darem-me algumas novas desses tempos.
Dos nomes que por aí aparecem a dar opiniões, apenas o João Franco é da minha geração e fomos quase dos primeiros a ir para essa guerra desconhecida. Era o ano de 1963 quando eu embarquei no, maldito para muitos, "Vera Cruz" para Angola ou melhor, para as "Áfricas", pois era o nome que o Zé Povinho chamava a esses lugares distantes.
Eu gostaria de mencionar que quando cheguei a Luanda, era ainda um jovem de 22 anos e com o posto de Furriel Miliciano, como talvez levasse escudos fui logo alvo da "caça" de alguns civis que, pensando que eu certamente era portador de dinheiro do Banco de Portugal, ofereciam até 60% acima do seu valor em angolares, visto que esse banco de Angola não existia e assim teriam uma maior chance de se salvaguardarem de ficarem monetariamente sem nada no caso de uma independência repentina.
Confesso que não senti da parte dos luandenses (não digo colonos,porque todos nós em terras americanas, o somos) alguma indiferença ou algo desagradável a mim dirigido quando da minha chegada a Luanda mas, quando regressei a essa mesma cidade nos fins de 64, então já era totalmente diferente, mas nada comparado com alguns fazendeiros que diziam que não precisavam nada de nós, talvez porque se criou na altura um programa (tardio) a que foi dado o nome "Psico" e em que se podia fazer queixa de qualquer abuso tanto civil como militar contra o angolano de cor.
Quando do meu regresso a Portugal em Fevereiro de1966, também aí em Portugal éramos mal vistos por certas pessoas, mas voltando atrás 40, 50 anos - defender a Pátria era um dever ou pelo menos era o "brain wash" que nos davam.
Em Setembro de 1966 parti para outros horizontes e só passado oito anos se conheceu a palavra democracia em Portugal - palavra que quer no Parlamento, quer em reuniões de politica, se abusa dela sem se saber o seu verdadeiro significado, porque já nasceram com ela.
Uma pequena estória vos conto. Um soldado do meu pelotão "O Paredes" deixou sua noiva muito chorosa quando partiu, só que ela para alimentar a sua dor, através da Revista Plateia tornou-se "madrinha de guerra" de um outro soldado que tinha embarcado antes do noivo e como regressou antes do mesmo, pediu para casar com ela e disse-lhe que pobre Paredes no lugar onde estava, "Nambuangongo", não tinha chance alguma de escapar com vida e a partir da última carta não mais escreveria, o que aconteceu.Eu sei deste acontecimento, porque o Paredes tinha apenas a segunda classe e era eu que o ajudava nas leituras e escritas das mesmas e também me senti derrotado.
Nos anos 60s eram muito populares as "madrinhas de guerra" e um número considerável deu em casamento.
Quem quiser por curiosidade pode ir ao Google e escrever a palavra Nambuangongo e aí terão uma imagem dessa terra perdida em Angola.
Joaquim

DIFERENÇAS (Comentário a "1 9 7 5 ", de Alfredo Justiça)

por Alfredo Justiça
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Diferenças

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João, escreveste um texto soberbo que nos trouxe à memória tempos confusos onde imperavam sentimentos contraditórios de conhecimento de factos e a cómoda posição “do deixa andar… não te rales”.
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Foram inúmeras as “Irenes” desse tempo, preparadas para enfrentar as vicissitudes da vida e por isso apetrechadas para lutar e levar de vencida a adversidade… e bem assim os “Jorges”, marionetas insufladas à procura de protagonismos balofos ancorados em filosofias que não entendiam e muito menos praticavam, parasitas que orbitavam os “aprendizes de feiticeiro” que, infelizmente, venceram e se tornaram nos mágicos que transformaram um País na “anedota” que hoje somos.

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Infelizmente, para mim, a experiência colonialista foi contrária à citada no teu texto. Fiz a guerra colonial numa província onde, assim que coloquei os pés em terra firme, no porto marítimo da Beira, senti, por parte dos chamados colonos, o ódio da recepção ao ponto de proferirem, cara a cara, sem pejo e respeito o seguinte apupo:

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- Que vens para aqui fazer? Terrorismo? Não precisamos cá de ti.
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Não classifiquei, na altura, este desabafo por parte de “brancos” locais. Talvez que tipos destes fossem apenas excepções, só que tive o azar de permanecer alguns dias por estas “bandas”, antes de continuar viagem para o meu destino final, e continuei a verificar que afinal não eram excepções. Recordo um primeiro sargento que comigo viajou e, não aguentando mais apupos do género, outros piores, viajou de regresso à Metrópole, preferindo ser preso por deserção a continuar num ambiente onde era hostilizado.

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Confesso que durante muitos anos o meu sentimento para com os chamados “retornados”, não foi de pesar ou dó mas de indiferença, só modificado quando tomei conhecimento dos verdadeiros perdedores dos actos levianos dos nossos políticos de então que pretendiam, e assim conseguiram, o poder instalando o anarquismo, dividindo para governar.

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Ainda está para contar o que se passou e isso não acontecerá enquanto forem vivos os causadores de estas e outras situações bem mais graves.

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Ainda falta saber o que aconteceu aos milhares de nativos que lutaram envergando a nossa farda e desfraldando a nossa bandeira. Sabemos, por portas e travessas, que muitos, demasiados, foram passados pelas armas em execuções sumárias pois temos por experiência conhecedora que o racismo era mais acentuado entre eles do que de nós para com eles e vice-versa.

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Por alturas desta tua estória da Irene e do Jorge, ninguém elucidou “os Jorges”, nos ambientes que eles frequentavam, até porque isso não convinha, que os tais colonialistas não habitavam África pois gozavam a vida, à custa dos usufrutos que de lá retiravam, em cidades Europeias, Paris, Londres, etc. Aqueles que regressaram, outros emigraram, foram empregados dos primeiros e apenas recebiam ordenados como qualquer trabalhador e viram as suas vivências interrompidas regressando, muitos deles, com uma mão à frente e outra atrás e por cá tiveram de retomar a luta do dia a dia num ambiente confuso e hostil.

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Não quero alongar-me mais. Escreveste um texto bem elucidativo da diferença entre “colonialista” e meros “retornados”, estes fizeram-se à sua custa, com trabalho, suor e lágrimas, aqueles à custa do trabalho destes.

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Um abraço

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A.Justiça

COMENTÁRIOS

Inês F disse:
Por estes dias no blog o tema é ‘quente’. Apesar dos anos que passaram, a colonização e a descolonização das províncias ultramarinas continuam “encaixotadas” no porão dos nossos pesadelos.
Trazer para a luz do dia os retratos da época colonial, com os diferentes ângulos de visão, autenticados por quem viveu por dentro essa época, parece-me simples e lógico.
Está mais que na hora de exorcizar os fantasmas e arejar os pesadelos. Antes que a peça termine e se apaguem as luzes desta nossa ribalta.
Inês

Guida disse...
Gostei muito deste texto e da sinceridade com que foi escrito. Bem hajas Alfredo.

João Ramos Franco disse...
Algumas das razões que me levam a não me alargar nas palavras sobre o que se passou em Angola, durante a guerra colonial, são aqui ditas pelo Alfredo Justiça, mas muito mais há para contar...João Ramos Franco
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Luisa disse...
Este é um depoimento muito sincero,muito do fundo do coração.Gostei muito de ler mas não estou de acordo com tudo o que ele diz.Mas é da discussão de pontos de vista diferentes que nasce a luz,não é?Luisa

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J.L. Reboleira Alexandre disse...
Este tema ainda é muito sensìvel.
Parece haver duas formas de «ver» a Guerra Colonial. A daqueles que a fizeram e a dos outros, que a leram pelos jornais ou outros meios de comunicação.
A mim o que me custa mais no nosso país, é a tentativa de branquear todo o processo. Penso ser devido ao facto de viver há mais de trinta anos num país onde os antigos combatentes têm direitos consagrados na lei fundamental do país, a beneficios, fiscais e outros, que vão muito além das propostas que Portas apresentou. Afinal, hoje como ontem, a ignorância continua a compensar!
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Luis disse:
Aprecio sempre a sinceridade e a frontalidade,que aparecem de forma evidente neste texto.Mas,como de certa forma lá está escrito,deve ser realmente ainda cedo para analisar o que se passou de forma fria e racional.
Tanto a guerra primeiro como a descolonização depois deixaram demasiadas feridas e há aspectos muito mal conhecidos.
Mas não fiquem mal entendidos:gostei de ler este depoimento e fez bem o gestor do blogue em publicá-lo!L
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Jorge disse...
Não refere a data em que tal facto aconteceu. Se foi em 1975, talvez encontre explicação para a recepção que teve. Eu estava em Angola na altura, às voltas com o meu repatriamento e as histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no periodo de 1974-75 até à sua independência, não eram nada abonatórias da farda que vestiam.
Cordiais cumprimentos.
Jorge Nicola
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João Ramos Franco disse...
Resposta ao comentário de Jorge Nicola.
Estive na guerra em Angola, de Dezembro de 1964 a Maio de 1967, e como miliciano, fico um pouco espantado quando me falam sobre o comportamento dos militares. Não sei se na guerra alguma vez sentiu a raiva, ódio e muito outros sentimentos, que debaixo de fogo me passaram pela cabeça… disparamos e nada vimos na nossa frente, apenas ouvimos as balas que vêm em sentido contrário…há uma verdade, matamos sem ver.
Não gosto de falar nestes assuntos e muito menos dos escrever, sei que na guerra acontece tudo o que não gostamos, vimos camaradas que, por o sistema nervoso já não suportar, cometem actos que naturalmente nunca fariam…
Se algum de vocês, após lhe matarem um soldado, foi obrigado a avançar (debaixo de fogo inimigo) sobre um acampamento guerrilheiro e conseguiu ver as caras de quem estava a disparar, deve sentir a consciência pesada.Nestas frentes de combate passaram factos que nunca deviam ter-se passado, mas que moralidade existe em falar das histórias que corriam sobre o comportamento dos militares em Moçambique no período de 1974-75 até à sua independência. Não arrisco a condenar qualquer facto só pelo que se dizia, sei o que é ter de tomar atitudes, não porque me tivessem feito mal a mim directamente mas por o terem feito aos meus soldados.
Por favor, vou a caminho dos 68 anos, poupem-me com as histórias que corriam e falem-me da verdade dos factos passados.
Penso que deixei esclarecido o Jorge.
Um abraço, do amigo
João Ramos Franco
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JJ esclareceu:
Esclarecimento ao Jorge Nicola: o Alfredo Justiça esteve em Moçambique em 1971, e é a esse ano a que se refere o seu texto.
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Anónimo disse...
Gostaria que o Sr. Reboleira esclarecesse quais são os direitos,beneficios fiscais e outros que os ex-combatentes (não antigos)usufruem.
Antecipadamente grato.
PC
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J L Reboleira Alexandre respondeu:
Não sei quem é o PC (personal computer ou Partido C... tanto faz). No entanto atendendo a que o pedido é exposto de maneira educada, vou tentar de forma abreviada focar os aspectos mais relevantes a que os Antigos (repito Antigos) Combatentes têm direito no Canadá.
Antes de continuar devo mencionar que neste país o serviço militar é voluntário, logo todos os que nele entram são profissionais, que não era o caso no nosso tempo. No meu caso, em 1974 na Europa e entre Outubro e Dezembro na zona de Nambuangongo, mais propriamente no Quixico, e depois em 1975 mais 9 meses em Luanda de onde regressei a um mês da Independência.
Voltando ao caso concreto do Canadá, sendo profissionais todos os militares, normalmente estão no activo durante 25 anos, passando depois à Reserva até aos 65 anos. Em termos de IRS, têm isenções próprias, que não poderei enumerar neste curto espaço. E na parte final da existência existem inúmeras instituições de Apoio e Assistência (aí chamam-se Lares), que apenas e exclusivamente aceitam antigos combatentes.
Voltando à definição de antigo ou ex-combatente, os únicos ex-combatentes que recebem pensôes são os que voltaram incapacitados dos diversos teatros de guerra onde o Canadá sempre esteve envolvido, normalmente como Capacetes Azuis, logo tanto poderá ser nas Honduras, ou no Haiti, como no Iraque, ou no Afeganistão. Só aqui já faleceram, creio 142 canadianos desde o inicio das operações, sendo os feridos contados por largos milhares.
Como a esposa do meu filho mais velho tem um familiar que regressou sem uma perna, sei do que falo e posso afirmar, que a pensão que recebe aos 29 anos é mais que suficiente para dar uma vida digna à esposa e aos filhos.Mas enfim, entrar neste campo é comparar algo que não tem comparação. Eu por exemplo, como estive 12 meses em zona operacional em Angola, fiz o pedido da tal pensão do Portas à qual julgava ter direito quando chegasse aos 65 anos. A resposta veio célere e sem direito a recurso: - O senhor como nunca trabalhou em Portugal, e vive fora do espaço da União Europeia, não tem direito a nada. Isto passou-se há cerca de 2 anos, honestamente não sei se esta regra do «viver fora da Europa» continua a ser válida, mas se fôr, lá temos mais uma daquelas leis feitas sobre o joelho, tão bizarra é a situação. Para terminar devo dizer que neste momento não estou absolutamente nada preocupado com isto, mas não haverá por aí muitos antigos combatentes na mesma situação a quem eventualmente essa pequena ajuda poderia ser útil ?
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PS: li o comentário do Jorge Nicola e a resposta do Justiça. Como em 1975 estava em Luanda posso afirmar que, infelizmente, os dois têm razão. Quanto à ética de alguns dos nossos graduados, nem tudo eram rosas meu caro. Tive conhecimento duma cena no quartel do GAC 1 no bairro Alvalade em Luanda, em Setembro de 75 (pobre da moça) protagonizada por soldados é certo, mas os graduados ali mesmo ao lado nada fizeram para a interromper. Era a guerra afinal. Todas as guerras têm destas coisas, e na altura ainda não havia câmaras digitais em tudo o que é sítio, para passar as imagens cá para este lado no dia seguinte.
Um destes dias trarei para aqui (estou na fase mais ocupada do ano, no meu trabalho) uma resenha do que foi a existência de um furriel vague-mestre em Luanda entre Janeiro e Outubro de 75.
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JJ disse:
Zé Luis :
Depois de ler o teu comentário primitivo e a pergunta do PC (?), julgo que ele não leu bem o que escreveste e julgou que vivias em Portugal e não no Canadá.
Ganhámos algumas informações mas, sobretudo, a promessa de umas memórias de um furriel em Luanda. Eu depois relembro-te... Abraço. JJ
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Anónimo disse...
Amigo! Entrei por acaso neste blog e me interessou muito o que escreveste sobre "Os retornados da África". Sou brasileira,professora de História e gostaria muito que se vc pudesse escrever algo sobre o Brasil précolonial e Colônia dos portugueses, na visão do europeu, o que você acha?
Ficarei muito grata, ok? Grande abraço! Dany Mative
(Cara Dany: como é que nós a podemos contactar? Escreva por favor um email para ex.alunos.ero@gmail.com )
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A PROPÓSITO DE "1 9 7 5 " (Artur R. Gonçalves)


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por Artur R. Gonçalves


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Há certas palavras que marcam uma época. Surgem de um momento para o outro, são utilizadas por todos até à exaustão e depois partem tal qual chegaram. De mansinho e sem deixar saudades. Comportam-se como um brinquedo novo nas mãos de uma criança mimada. Explora-o em todas as suas potencialidades na fase da descoberta, põe-no no caixote das bugigangas estafadas num momento de enfado e acaba por se esquecer da sua existência em períodos de novas experiências. Uma supernova de brilho intensamente efémero. «Colonialista» é uma dessas palavras. Dizia-se em surdina nos meios clandestinos de um país amedrontado. Gritou-se aos sete ventos nos meios esquerdistas do período revolucionário em curso. Na altura, quando ainda não havia pruridos de maior com o politicamente correcto, o termo passou a ser substituído pelo de «retornado», bem mais contundente na sua forma de atingir o outro, aquele que segundo o vulgo tinha vivido a explorar os africanos das colónias e agora se preparava para fazer o mesmo com os portugueses da metrópole. Os ânimos estavam acirrados e os excessos justificados. Mas, palavras leva-as o vento, se para aí estiver virado, vento este que se encarregará de as substituir por outras, se também para aí estiver voltado. Durante uma breve temporada, esteve na moda o modismo «neocolonialista». Parra que já deu fruta, apesar da sua preocupante actualidade.
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A crónica do JJ remete-nos para um tempo pretérito que recordo com alguma nostalgia. As referências que faz aos primeiros anos da década de 70 marcaram toda uma geração que andava na casa do 20, que frequentava de uma forma mais ou menos desajeitada as faculdades do império, que fazia como sabia ou julgava saber as guerras do além-mar colonial, que gozava férias descontraídas nas praias marítimas e fluviais de um país banhado por um sol periférico mas sempre presente, que fazia compras nos Porfírios, que ouvia LP(s) na Valentim de Carvalho, que ia ao jaze de Cascais, que lia Tolstoi-Proust-Camus alternados com Marx-Mao-Lenine, que fazia trinta por uma linha para se sentir vivo e actuante. Às vezes, até já estava envolvida no mercado de trabalho. Pertenço a essa geração cheia de promessas que a vida se encarregou de adiar na sua grande totalidade. Uma geração como as outras. Em suma. Nem melhor nem pior. A nossa.

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Desconheço até que ponto o JJ é o jovem protagonista deste diálogo de verão recordado à distância de décadas, deste diletante que na história (não altura ainda não estava na moda a palavra estória) dá pelo nome de Jorge. Até que ponto o factual anda comprometido com o fictício. Pouco importa. Todos nós, com essa idade, tivemos uma certa fixação por uma qualquer Irene. Os verdes anos têm dessas coisas e os anos da maturidade a capacidade de os transmitir em forma de escrita. Escorreita, fluida, cativante. Qualidades próprias de quem tem um domínio cabal da língua e da potencialidade que as palavras por vezes têm de dizer o indizível.

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Artur R Gonçalves
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C O M E N T Á R I O S
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Tina disse...
A estória de João Jales (será o Jales que conheci na década de 70, antes do 25 de Abril, natural de Caldas da Rainha?) tem o mérito de pôr o dedo na ferida que foi a vivência após a Revolução de Abril de uma forma realista e matura. Ferida vivida no seio das famílias e apaixonadamente transporta para o debate público, com um carácter discriminatório que muito me perturbou então. Em linguagem clara e apaixonada, que nos identifica com a época.
O Artur completa com a sua análise essa estória - que pouco tem de estória já que descreve bem uma época bem real - com o seu dom inato de lidar com as palavras.
Todas as gerações enfrentam uma determinada transição, tendo a nossa sofrido na pele uma bem dolorosa. Mas crescemos com as dores, que não foram piores que as dos nossos pais no tempo da segunda guerra, e hoje estamos aqui a analisar, ou antes, a reviver tranquilamente os tempos da nossa juventude, curadas já as paixões extremistas em que participámos nos grupos da faculdade que frequentámos.
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António J M disse...
O problema é que,como o JJ conclui na sua história(ou estória-será verdade ou ficção?)os colonialistas não eram os colonos!
Muito bem analisado e excepcionalmente bem escrito este comentário do Artur que aborda a questão colonial e também uma época de esperanças,infelizmente não cumpridas.
"Pertenço a essa geração cheia de promessas que a vida se encarregou de adiar na sua grande totalidade" escreve o Artur,e eu acrescento:-E eu também!
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jorge disse...
se a história do jales era boa e bem escrita,este a propósito não lhe fica nada atrás!já tinha lido coisas do artur no blogue da escola e vê-se que é alguém com grandes capacidades nesta área.benvindo a este blogue!j
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JJ disse:
Não posso deixar de saudar, que me perdoem todos os outros, a chegada a este Blog da minha amiga Nitina que não vejo há... o quê? trinta e tal anos? Envia-me o teu contacto, temos muito que conversar.
Aproveito para responder ao Artur dizendo-lhe que, embora "1975" seja uma ficção e eu não ser o Jorge, mantive efectivamente um diálogo com uma jovem retornada, que não se chamava Irene, numas férias que passei em Mondim de Basto. Há sempre algo de nós naquilo que escrevemos, como sabes.
Apreciei muito o teu comentário, não me surpreende a qualidade da tua prosa nem a precisão da tua análise, porque sou já um atento leitor das tuas intervenções sobre literatura.
Aos outros comentadores e intervenientes nesta série responderei no seu final.
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Maria Manuela Gama Vieira disse:
Gostei muito das " palavras que surgem de um momento para o outro, partem tal qual chegaram. De mansinho e sem deixar saudades."
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Tina disse...
João Jales há poucos, não é? Lembro-me que há 30 anos ainda me calava para te ouvir falar...
Contactei-te através do Facebook, por ser mais fácil.
Sou "rusga" pois não frequentei o Externato Ramalho Ortigão, mas espero que me perdoem a invasão. Aprender não ocupa lugar, não é?
Abraço.
Nitina (que já não o é para muitos!)
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1975

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- Mas quais colonialistas? Não sei do que falas, o meu pai era um empregado de escritório lá em Angola, a minha mãe tratava da casa e cozinhava de vez em quando uns bolos e uns doces para fora… Pensavas o quê?

Assim falou a Irene, respondendo a umas considerações esquerdistas do Jorge sobre o papel dos portugueses em África. Ele ficou calado, esta descrição de uma pequena burguesia com dificuldades não encaixava no quadro que imaginara, em que o pai da garota, um anafado colono de pingalim sentado numa varanda, vigiava um grupo de africanos que trabalhavam a sua terra...

Nesse final de Setembro de 1975 o Verão nunca mais acabava, mantendo-se a temperatura bem acima dos trinta graus. O rio, à beira do qual estavam os dois estendidos, era o único refúgio possível. Ao longe, um ribombar surdo quebrava ocasionalmente o silêncio que os envolvia, o que, juntamente com uma nuvem negra no horizonte, parecia prenunciar uma trovoada, frequente nessa época do ano.

Ambos tinham vinte anos, ela regressara há pouco de Angola com a família, ele frequentava vagamente a Universidade de Lisboa, coleccionando inscrições, sem entusiasmo nem rumo definido, em Faculdades diferentes. Circunstâncias diversas tinham reunido os dois neste lugarejo esquecido do Minho, de onde as famílias de ambos eram oriundas, ela por necessidade de refúgio enquanto os pais recomeçavam a sua vida na metrópole, ele numa espécie de exílio e castigo que não lhe pesava, já que lhe evitava as discussões familiares sobre a sua vida académica…

Durante o silêncio que se seguiu ele olhou para ela, um corpo magro com uns olhos assustados, não sabendo o que responder. Não era este o rumo de conversa que imaginara quando, depois de almoço, se encontrara com ela para virem gozar os prazeres daquela praia fluvial. Com a cabeça cheia de inflamadas opiniões e definitivas certezas sobre tudo, que adquirira em conversas pela madrugada alfacinha e nalguns livros que costumava folhear e passear, mais do que ler, pelos cafés e cervejarias que frequentava, esperara que ela o ouvisse, admirada e admiradora. Mas não, e o tom de firme discordância vindo daquela criatura, aparentemente frágil, tinha-o apanhado de surpresa.

- Tinha a ideia que as coisas eram lá mais fáceis – acabou por responder, enquanto entravam na água – ouço muitos relatos que incluem festas, belos jardins, criados para todos os serviços…

Foi interrompido por uma “amona”, engasgando-se com a água morna e límpida. Embrenhado na sua dissertação esquecera-se que estava a discutir e tomar banho com uma garota da sua idade! Durante uns mergulhos e umas braçadas preguiçosas as considerações foram suspensas.


- Em Angola tudo era mais simples e menos formal – continuou ela depois, enquanto se estendia na toalha – aqui há mais frio, mais roupa, mais cerimónia, mais gente a reparar em tudo o que fazemos e dizemos. Se calhar tem a ver com o clima, na Primavera, quando vim, o frio ainda era de rachar, imagino como será passar aqui o Inverno!

- E aqui no Norte é ainda mais frio do que em Lisboa – e contou-lhe, a propósito, a sua vida lá, as longas noites a conversar precisamente sobre a necessidade de novas mentalidades e novas formas de organização social. Assistira a algumas reuniões da extrema-esquerda, era amigo de militantes do Partido (dizia-se só assim, o Partido) mas as regras rígidas, a disciplina e a aparente frugalidade dos que se devotavam dessa forma à causa da classe operária não o atraíam. Um grupo anarquista de bons vivants acolhia-o, sem grandes obrigações a não ser vez em quando dar à manivela de uma máquina policopiadora na sede da Batalha ou colar uns cartazes - “Arriba Franco, màs alto que Carrero Blanco”, mas ela não percebeu a piada, não conhecia os pormenores do atentado que vitimara o primeiro-ministro espanhol. Falou-lhe então dos romances clássicos que devorava e que continuavam guardados (escondidos?) no seu quarto alugado, porque os clássicos agora eram Marx, Mao e Lenine, que tinham substituído Tolstoi, Proust e Camus.

- Ah, os meus livros! Nem sei se estão cá ou se ficaram lá – lembrou-se ela – E a minha roupa, tenho vivido só com o que trazia numa pequena mala, sei que há uns caixotes com coisas que vieram de barco mas estão ainda em Lisboa, nem sei bem o que têm. Não havia Porfírios em Luanda, claro, mas havia onde comprar roupa moderna, o Augustus tinha uma boutique sempre com novidades e havia também a Xabanu… Eu não tinha muito dinheiro mas gostava de ver e, de vez em quando, juntava uns restos das semanadas e lá comprava qualquer coisa, geralmente nos saldos.

Até ela ouvira falar dos Porfírios, que eram realmente o centro da moda jovem portuguesa. As suas montras cheias de roupa com desenhos coloridos e psicadélicos, flores, calças que varriam toda a largura do passeio e adereços femininos de tamanhos disparatados e formas ameaçadoras eram um mundo fascinante; nem o Jorge resistia a lá comprar uma ou outra peça de roupa mais esotérica. Para usar nas festas e encontros fora dos círculos revolucionários, claro.
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Ela continuou:
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-Discos, de que tanto falas, não tinha, eram muito caros. Mas muitos amigos tinham as últimas novidades, que não vinham da metrópole, de onde chegavam sempre muito atrasadas, mas da África do Sul, através dos funcionários da Tap e das companhias de navegação.

O Jorge contou-lhe então das tardes passadas na Melodia, Valentim de Carvalho, Sinfonia… Escolhiam-se os discos nos caixotes de exposição e entregavam-se a uma funcionária que os punha a tocar num dos gira-discos disponíveis; a cada um deles correspondia um cubículo, parecia uma cabine telefónica, onde um altifalante de má qualidade dava uma ideia do conteúdo dos LPs. Ele ouvia e comprava menos discos ultimamente, o Rock transformara-se, depois da crise petrolífera de 1973, numa música formal, tecnicamente bem executada, com longas composições e muito trabalho em estúdio, mas tinha perdido a sua urgência, excitação e espontaneidade. O chamado Rock Sinfónico (Yes, Genesis, Camel, Renaissance, Emerson, Lake and Palmer) não era exactamente o que o Jorge apreciava:

- Vi os Genesis em Cascais em Março deste ano. Um bom concerto, muito bem montado, com uma cenografia fantástica, parecia uma ópera, e um som como nunca ouvi. É claro que gostei, mas prefiro uma música em que me sinta mais participante e não tanto espectador… Ainda por cima à entrada estava o Copcom, com camuflados e chaimites, a disparar rajadas de metralhadoras para o ar como forma de obrigar as pessoas a formar filas para entrar, pareciam um bando de cowboys!

- Não me fales de metralhadoras, nem imaginas o que aconteceu no último filme que vi em Luanda- respondeu a Irene. - Foi também em Março passado, já havia trocas de tiros entre o MPLA, a FNLA e a UNITA. Cada um deles controlava uma zona de Luanda e havia sítios em que se trocavam tiros de prédio para prédio! O filme que fomos ver no cinema Império, ao ar livre, era sobre a Segunda Guerra, o ataque dos americanos a umas ilhotas no Pacífico. A segunda metade do filme era um tiroteio constante, demorámos um bocado a perceber que os buraquinhos na tela não podiam ser feitos pelos actores… Saímos do cinema de gatas e a rastejar, enquanto ouvíamos e víamos as balas tracejantes passando-nos por cima da cabeça!

- Mas já havia guerra mesmo ali ao teu lado antes do 25 de Abril – fez notar o Jorge.

Mas “ao lado” era uma má escolha de palavras, tudo em Angola funcionava numa escala diferente. Ela explicou-lhe que “ali” era a centenas de quilómetros de distância, só a passagem de colunas militares, veículos e fardas, lembravam a guerra colonial. Esta de que falava era à porta de casa:

- Nos últimos dias andávamos com vários cartões, uma mistura de bilhete de identidade e salvo-conduto, um de cada um dos partidos. Tínhamos que saber diariamente quem controlava a zona onde queríamos ir, não se podia mostrar o cartão errado...

Tudo isto parecia longínquo e irreal ao Jorge, só lhe importava saber que a sombra da tropa e da guerra colonial já não pairava sobre ele. Interessou-se mais pela descrição que ela fez seguidamente das praias, da baía de Luanda e da sua Ilha (que afinal era uma península, acabou por perceber), o Mussolo e os dias de praia que entravam pela noite dentro…

Ele ouvia-a, com os olhos semicerrados por causa do Sol que lhe aquecia e secava o corpo, sentindo-se transportado a esses locais paradisíacos… Virou a cabeça e olhou para ela para lhe pedir mais pormenores, a conversa era agora mais agradável, a Irene parecia mais em consonância com aquela tarde abafada e parada, em que as suas vozes eram o único som audível. Depois das vindimas, que tinham sido cedo nesse verão quente, todos os autóctones tinham muito que fazer, só eles dois se podiam dar ao luxo de gozar estes últimos dias na praia fluvial. Mas nem chegou a abrir a boca, o humor da sua companheira sofria alterações bruscas, conforme as memórias que lhe vinham à cabeça:

- O pior é o curso que interrompi – continuou a Irene – ainda não sei se me dão equivalência às cadeiras de Engenharia que fiz na Faculdade de Ciências de Luanda. Tenho um certificado que consegui trazer mas estão a colocar-me montes de dificuldades no Porto… Deixei Malanje, onde o meu pai trabalhava na Cotonangue, para ir para Luanda estudar. Sendo filha única não foi fácil fazê-lo e agora nem sei sequer se esse sacrifício me vai servir para alguma coisa!

- Acalma-te, vais ver que tudo vai correr bem, se és boa estudante vais certamente completar o curso num instante, a tua vida aqui em Portugal vai ser muito melhor do que imaginas e vais-te esquecer de Angola sem dar por isso – respondeu ele ... mas realmente pensando que ela não teria força para ultrapassar o mau bocado que passara e o que ainda a esperava. Entretanto afastava uma incómoda mosca que lhe picara a perna:
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– Raio das moscas aqui picam que se fartam!

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Ela olhou-o longamente e suspirou em silêncio, compreendendo que ele não compreendia e sabendo, com a sabedoria de quem viveu, que ele não tinha ainda vivido o suficiente e ela já tinha vivido demais...

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Enquanto ele procurava, mas em vão, desviar o tema da conversa com um galanteio ou uma graça em que era geralmente hábil, a trovoada desabou literalmente sobre eles, grossos pingos de água morna encharcaram-lhes a roupa e a terra sedenta começou a exalar um cheiro inconfundível, enquanto os trovões e os relâmpagos pareciam ter-se concentrado sobre e contra eles.

A trovoada libertou ambos dos seus mundos, dos seus pensamentos e das suas recordações, obrigando-os a empenharem-se na tarefa comum de salvar a roupa e o lanche, fugir da chuva e regressar a casa.

Setembro acabou e o Jorge regressou a Lisboa, nunca mais pensando nesse encontro com a Irene, embora as diversas conversas com ela nesse mês lhe tivessem alterado definitivamente a forma de encarar a questão dos “retornados”. Nas raras e curtas idas à aldeia nos anos seguintes nunca mais a reencontrou. A aldeia cresceu e transformou-se tanto na década de 80 que, ao voltar no Verão de 1994 para passar lá uma semana, quase não a reconheceu.

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Passeando uma noite a pé com um primo, residente, foi sabendo as estórias à volta das novas ruas e casas que tinham surgido. A aldeia original que ele conhecera era hoje como que um subúrbio desta nova e moderna povoação. Subitamente parou, admirado. Perto da casa dos seus avós erguia-se uma casa moderna, num estilo arrojado e claramente diferente de todas as outras, integrando materiais e assimetrias que mostravam um gosto requintado e inesperado neste local. O primo informou-o:
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- É a casa da Irene, lembras-te dela? Formou-se em Engenharia Civil e casou com um arquitecto no Porto, onde estudou. Fizeram aqui esta casa, que as pessoas da terra não apreciam muito, mas que já foi incluída em revistas estrangeiras de arquitectura, como exemplo das novas tendências nessa área.

Enquanto admirava a arrojada habitação o Jorge recordou-se da frágil Irene, que tinha afinal cumprido os seus planos de vida. Esta casa era a demonstração de que ultrapassara o regresso atribulado, o frio que tanto estranhara, as saudades de África, os problemas familiares … e esquecido certamente o difícil ano de 1975 e o jovem diletante e imaturo que, não a tendo verdadeiramente conhecido nem compreendido, receara por ela vinte anos antes.

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João Jales
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C O M E N T Á R I O S
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luis machado disse...
João
É bom o teu texto,fez-me regressar a Lisboa, ao mundo de que falas.
Casei com uma "Irene",embora não seja do Porto, e não namorei em Mondim de Basto.
Recordo-me do Jorge em Lisboa,numa manifestação anarquista(partiram a montra do Apolo 70, simbolo do consumismo capitalista)a distribuir panfletos, com uma canadiana com o capuz levantado para não ser reconhecido.O problema era que o gajo tinha quase dois metros de altura...
Agora uma tirada filosófica:"Escrever é sempre escrever para alguém."Eduardo PC.
Não percas o jeito.
Abraços
Luis.
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salette disse...
João, adorei a tua história.É uma fotografia perfeita de uma época, de um ano mesmo. Sentimos que andamos por lá.Foi muito bom iniciar o meu dia com uma leitura tão deliciosamente agradável.
beijinho e.....até á próxima!
Salette
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jorge disse...
fantástico,não tenho melhor para dizer.
o confronto de dois mundos numa tarde de verão enquanto dois adolescentes tomam banho e apanham sol.do melhor que aqui li,merecia outra divulgação.
angola continua a ter as maravilhas que a irene viveu mas já não se podem viver da mesma maneira.
j
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J.L. Reboleira Alexandre disse...
O Jorge conheceu a Irene na Europa. Eu conheci «Irenes» em Luanda, nesse Verão tão quente. A minha estadia nessa bela cidade, entre Janeiro e Outubro de 1975, valeu mais do que todos os livrinhos de bolso(vermelhos ou não) que lera meses antes.
As tragédias vividas por todas as «Irenes» antes e após o abandono daquelas terras côr de fogo, foram fortes de mais não só para os próprios, mas também para nós, quais jovens imberbes, que assistiamos, impotentes e completamente ultrapassados pelo desenrolar dos acontecimentos.
Há por aqui muita história para contar. Com receio de me repetir, volto a dizer que assistimos aqui a um dos momentos mais altos deste blogue.
Obrigado João!
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Sérgio Lopes disse.
Belíssimo texto e um momento elevado de qualquer blogue. Por favor debita-o, com os comentários, no blogue irmão IVS Está lá muita gente que esteve por aquelas bandas nesse período conturbado de tanta, tanta asneira, mas também com gente de cabeça fria.
Não o podes saber, porque nunca to disse, mas eu fui em 1974/75 um dosprincipais coordenadores operacionais da famosa Ponte Aérea. Na altura em que se deu o 25 de Abril era o director comercial da TAP para Angola e S.Tomé, com base em Luanda. Em Agosto de 1974 fui notificado de que regressaria à sede da TAP em Lisboa, mas decidi abdicar dessa "cómoda"transferência e ofereci-me como voluntário para planear e operar a Ponte Aérea que já estava no horizonte de um punhado de pessoas que tinham mantidoa cabeça sobre os ombros e tinha previsto atempada e silenciosamente que a balbúrdia em que o país tinha caído resultaria na necessidade de evacuar a população caucasiana rapidamente para terreno mais seguro.
Quando, finalmente, o poder central se decidiu pela evacuação já tinhamos tudo preparado. Não sei se tens consciência de que essa evacucação ainda é a maior Ponte Aérea toda civil (Vietname foi militar) da história, não tendo, porém, chegado ao Guiness. A história toda ainda está por contar.
Grande abraço e parabéns.
Sérgio
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Isabel Esse disse...
Ainda ninguém falou da fotografia:lindissima,repousante,tranquila,mas que não sei se tem mesmo relação com a história.
Como sempre nos teus contos estamos lá,sentimos o calor,a chuva,a trovoada,tudo!
Não resisto a fazer copy - paste para perguntar uma coisa :'Ela olhou-o longamente e suspirou em silêncio, compreendendo que ele não compreendia e sabendo, com a sabedoria de quem viveu, que ele não tinha ainda vivido o suficiente e ela já tinha vivido demais...'-porque é que as heroinas das tuas histórias são mais sábias que os heróis?
Adorei!IS
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22XXMD disse...
1975 marcou muita gente,eu inclusive.
Depois do 25 de Abril de 74 muita coisa mudou mas foi certamente entre esta altura e o verão de 75 que uma multidão de sentidos ou sentimentos, a maioria dos quais se tornariam pesados contratempos, marcaram para sempre a minha saida da tão "guardada" adolescência.
De uma forma ou de outra todos temos "Irenes" ou "Jorges" guardados nas nossas memórias. foi com muita tristeza que reencontrei alguns desses personagens da minha juventude ao ler a estória que o JJ tão bem transpôe para este Blog.
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Luis L disse...
Uma boa história com um triste final, essa Irene pelos vistos construíu uma "taveirada" muito polémica no meio dos nativos - isto ainda não é Angola, pá! ;-)
Lamy
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Luisa disse...
História que é uma metáfora,escrita com o estilo aparentemente simples do JJ.E digo aparentemente simples porque a prosa que parece um relato de uma notícia de jornal tem todos os sentimentos e emoções possíveis e imaginários.E muitos dos traumas e mal-entendidos daquela época.
Quem escreveu que merecia outra divulgação?eu assino por baixo!L
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Anabela disse:
João, mais uma vez parabéns à tua escrita. Consegues encantar o pessoal !!!
Concordo plenamente quando o Jorge comenta que Angola continua a ter as maravilhas relatadas pela Irene, mas que hoje são impossíveis de serem vividas e sentidas da mesma forma. Constato isto frequentemente pois tenho colegas em obras em Angola e que abordam a actual vivência que se tem neste país.
Não eram só as colunas militares a fazerem-nos lembrar que existia guerra mas também, e não esquecerei, o barulho dos helicópteros a passarem sobre a capital em direcção ao Hospital Militar. Já sabíamos que era sinónimo de estarem a transportar os nossos jovens militares feridos ou mortos... Era um arrepio tremendo que se sentia, impossível ficar-se indiferente a esta situação...doía muito.
Beijos
Anabela Miguel
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Luis disse...
Extraordinário texto,retrato de uma época em mais do que um aspecto...Mas como é que logo tu não te lembraste de acrescentar este video:
Estivemos todos em Cascais em 1975 para um dos espectáculos das nossas vidas,concordarás???L