ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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O aniversário da Dadinha

por João B Serra
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O topo da sala, preenchido com sofás e cadeirões, estava literalmente ocupado por senhoras. A conversa ia animada, naquele tricô interminável que individualizava a cavaqueira feminina das Caldas, mas nenhuma das intervenientes dispensava um olhar de relance pelo resto da sala. Eram as nossas mães. Vigiavam a mesa das comidas e bebidas, o comportamento dos filhos e filhas (e, acima de tudo, dos colegas e das colegas de cada um), tentavam adivinhar as conversas e interpretar os olhares trocados entre uns e outros, interpelando-os por vezes.
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Na parede fronteira à janela, sentavam-se os convidados da Guida, a irmã mais velha da aniversariante. Tinham 3 ou 4 anos mais do que nós, já andavam na Faculdade, formavam um grupo à parte. Os rapazes, em maioria, espreitavam com interesse mal disfarçado para as raparigas mais novas, avaliando as suas possibilidades de serem bem sucedidos quando chegasse a altura de as abordar. Tentando ignorá-los, a sua presença causava-nos a nós, rapazes mais novos, apreensão e suspeita. Percebiamos a impaciência dos seus gestos e olhares. Há muito que a conversação se esgotara entre eles, decorridas que eram mais de duas horas desde a sua chegada.
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Numa mesinha de canto uma pilha de discos, LP’s e 45’ e o respectivo gira-discos aguardavam o momento de entrarem em acção. Vários candidatos se prestavam a essa tarefa, mas a autorização para o início da dança não viera ainda.
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Aquele era o momento pelo qual todos ansiavam. Os que namoravam e os que tinham esperança numa oportunidade para começar a namorar, os que gostavam de dançar e os que, gostando menos, apreciavam aquele jogo de contacto físico permitido. Os que vibravam com a música e os que, apesar de menos sensíveis aos acordes tiravam prazer da convivência algo ruidosa, mais livre e menos formal daquelas alturas. Nos aniversários, era o ponto culminante da festa, esperado para depois do jantar.
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Mas naquele as coisas decorreram de modo diferente. A sequência habitual foi interrompida por uma imposição oriunda do grupo das mães. Era Sábado de Aleluia: dançar não era permitido.
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Para a Dadinha e seus pais, aquele interdito era completamente desconhecido. O pouco contacto com os preceitos da Igreja explicavam a imprevidência: celebrar um aniversário no Sábado de Aleluia.
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A Dadinha parecia desolada. Os pais, preocupados, hesitavam sobre a forma de lidar com a situação: ceder à imposição das mães ou forçar as coisas. Alguém, creio que um dos amigos da Guida, teve uma ideia sensata: negociar. Às 11h30 dirigiu-se triunfante à mesa dos discos e pôs um 45’ a rodar. Toda a gente bateu palmas. Tínhamos entrado adiantados no Domingo de Páscoa.
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João Serra
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c o m e n t á r i o s
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João Ramos Franco disse...
Como já nos vem habituando, o João Serra, apresenta-nos um bom conto. Ele coloca os personagens na Páscoa, em determinada época e os condicionalismos sociais da data.
Criando uma imagem a quem lê, de uma simples festa de anos, com todos os ingredientes normais na sociedade Caldense.Vejamos, temos uma sala, com mães vigilantes, a juventude com a sua normal impaciência e a data a estragar a festa, por a família da aniversariante não estar muito ligada aos costumes e preconceitos locais.
As horas a passar e o esperar do passar de Sábado de Aleluia, para Domingo de Páscoa, mostram-nos a realidade dos preceitos da Igreja, que regiam a moralidade e a imoralidade, na época.
João Ramos Franco
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Isabel X disse...
Particularmente bem conseguida a descrição dos vários grupos, respectivos territórios e códigos de relacionamento mútuo. A expectativa do baile, que durante algum tempo parece gorada, acaba por conduzir a um final feliz. O leitor vai seguindo o desenrolar da história com crescente interesse, para o qual contribui decisivamente o ritmo da narrativa. Em mim, no entanto, subsistem dúvidas: terá o tão esperado baile durado apenas meia hora para que esse adiantamento do Domingo de Páscoa merecesse palmas? Ou será que as negociações incluiram também o prolongamento da festa de aniversário para além da meia-noite? Espero que assim tenha acontecido e que às mães vigilantes
(e beatas) tenha, entretanto, dado o sono.
- Isabel Xavier -
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João Jales disse:
Apesar do "happy end" não tenho a certeza de não estarmos perante mais um triunfo das "conveniências" sobre as convicções. E nem a meia hora ganha nas negociações me convence do contrário...
No meu tempo as mães já não iam às festas de aniversário e os adultos eram apenas momentânea e ocasionalmente tolerados nos recintos de dança destas festas particulares.
O episódio é relatado com muitos pormenores e poucas palavras,com a habitual mestria do autor (como a Isabel já fez notar). JJ

2 comentários:

João Ramos Franco disse...

Como já nos vem habituando, o João Serra, apresenta-nos um bom conto. Ele coloca os personagens na Páscoa, em determinada época e os condicionalismos sociais da data.
Criando uma imagem a quem lê, de uma simples festa de anos, com todos os ingredientes normais na sociedade Caldense.
Vejamos, temos uma sala, com mães vigilantes, a juventude com a sua normal impaciência e a data a estragar a festa, por a família da aniversariante não estar muito ligada aos costumes e preconceitos locais.
As horas a passar e o esperar do passar de Sábado de Aleluia, para Domingo de Páscoa, mostram-nos a realidade dos preceitos da Igreja, que regiam a moralidade e a imoralidade, na época.
João Ramos Franco

Isabel X disse...

Particularmente bem conseguida a descrição dos vários grupos, respectivos territórios e códigos de relacionamento mútuo. A expectativa do baile, que durante algum tempo parece gorada, acaba por conduzir a um final feliz. O leitor vai seguindo o desenrolar da história com crescente interesse, para o qual contribui decisivamente o ritmo da narrativa. Em mim, no entanto, subsistem dúvidas: terá o tão esperado baile durado apenas meia hora para que esse adiantamento do Domingo de Páscoa merecesse palmas? Ou será que as negociações incluiram também o prolongamento da festa de aniversário para além da meia-noite? Espero que assim tenha acontecido e que às mães vigilantes (e beatas) tenha, entretanto, dado o sono.
- Isabel Xavier -