ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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DEPOIMENTO DE JOSÉ CARLOS NOGUEIRA

José Carlos Nogueira







Só por seres tu a pedir é que me propus dar o meu testemunho. Vais passar por várias vergonhas.




Ora vejamos, temos que dividir o nosso tempo em vários segmentos:

1º O tempo de aulas – profundo, rigoroso, tendo só como escape as aulas, já nessa altura obedecendo ás novas técnicas pedagógicas, de Canto Coral do Prof. Carlos Silva. Estávamos sujeitos a uma disciplina férrea e à tragédia mensal da caderneta de notas!...drama, lembro-me perfeitamente da assinatura da caderneta do Tó Freitas pela encarregada da educação (?), a criada. Sofríamos as palmadas do Dr.Azevedo, o vexame e a vergonha de sermos confrontados com os nossos colegas mais velhos no “ carne sem osso” ou noutras manifestações parecidas. Enfim, todo o romance e drama que víamos no cinema aos Sábados no Pinheiro Chagas ou no Salão Ibéria (onde por 2$50 para a Geral e 4$00 para a Segunda plateia), víamos em 31 partes e 15 episódios as atrocidades de que éramos vítimas dos regimes nazis das histórias e que passavam “mutatis mutandi” para o nosso dia a dia…o poeta Dr.Bruno, a refugiada D.Irene, o marcial Dr.Perpétua, a cândida Dra Isabel, o vilão Dr. Mateus, que nos obrigou a mostrar o nosso jeito para a cerâmica manipulando barro, cujo resultado foi o esperado: toda a sala de aula suja com objectos fálicos por tudo o que era sítio, inclusive nas batas da nossas colegas. Éramos uns artistas……

Hoje em dia penso que a juventude também tem uma vida virtual, assente nas histórias dos gameboys, playstations e tvs, onde cada um é herói ou vilão conforme os dias. Além desse período onírico, tínhamos obrigações morais e religiosas consubstanciadas na ida à catequese aos sábados, onde a menina Dora, Vestal e Virgem, nos dava os primeiros ensinamentos dessa verdade bíblica e dogmática: Deus criou-nos à sua imagem e semelhança, menos ao Bigodes, que era feio como um raio.

2 º - Depois, sim, depois era o contacto com a natureza e com as beldades do tempo...... Íamos para o Parque jogar o ringue com o Padre António Emílio e mostrar perante o sexo oposto como éramos viris e fortes, sendo capazes de acertar com o ringue nas partes mais frágeis das nossas contendoras, fazendo-as chamar-nos brutos, pois acertávamos nos seios que despontavam já nesse tempo e nós na nossa ingenuidade pensávamos que só serviriam para amamentar os bebés.......Pois era assim. Mas esse contacto sadio servia também para despertar dentro de nós o "Logos Spermaticus" e logo fazer promessas de amor eterno às nossas eleitas, mostrando-lhes todo o afecto de que éramos capazes, tendo nessa altura batido o record de afectos o Ricardo com 40 cotoveladas na Helena até ao 1º intervalo no salão Ibéria. Intervalo, quer dizer mudança de bobina, o que era logo a seguir aos documentários culturais da época: Os Três Estarolas, Pamplinas, Charlot, Bucha e Estica e as actualidades nacionais. O amor era assim, cheio de complexos e segredos. Crescemos e, devido à nossa sólida formação moral e intelectual, as nossas atenções voltavam-se para outros horizontes: jogar bilhar no Central, na variante 104. Os mais calmos tinham como desporto o xadrez, evoluindo segura e tenazmente para o póquer no Sporting das Caldas, que nós entendíamos ser uma forma de manifestar uma oposição ao regime, pois o edifício do Sporting pertencia à família Freitas. O Tó também era atacador. Introduzimos também no Casino esses jogos de sociedade como o Sete e Meio, Lerpa e Montinho onde o incauto Sr. Mourão deixava diariamente uma pequena fortuna-10$00.Nesse tempo correspondia a 4 gerais no Pinheiro Chagas, uma visita ao Alex (falamos mais tarde) ou um episódio de amor com a Nhenha ou a Gadinhas. Bons tempos.....! Depois, bem, depois é uma verdadeira chatice: exames-chumbos-castigos-exames-chumbos….

3º- De repente temos 16 anos, somos envolvidos pelo Elvis e pelo Rock and Roll, e descobrimos que nos portávamos tal e qual como a juventude no “Sementes de Violência”….Fumávamos às escondidas dos nossos Pais, mas em frente das miúdas. Primeiro queimámos a barba de milho, depois caímos directamente no mata-ratos, evoluindo daí para a droga mais pura ao nosso alcance: os Definitivos, cigarros estreitos e já feitos, que tinham o condão de mascarar a nossa falta de jeito para enrolar cigarros. Descobrimos os bailes, no Casino no Verão, os assaltos no Carnaval efectuados a casas respeitadas, como a da D.Maria da Graça ou a casa do Toni Vieira Pereira, ou organizados por nós na Esplanada do Parque, onde se assistiram a cenas Shakespearianas de amores não correspondidos que levavam o herói a tentar suicidar-se, fechando-se no frigorífico enorme que havia no café. Era resgatado no último minuto pelo 112 da altura que era uma garrafa de bagaço (convenhamos o homem estava hipotérmico). Nos próprios dias de Carnaval havia bailes no Casino, no Lisbonense e, para os mais esclarecidos, nos Bombeiros.

Moda que perdurou pelos anos 50 até meados dos anos 60. Esta geração, que chegou com tanta facilidade aos anos 60, foi a mesma que chegou a Angola, Moçambique, Guiné, Timor, tendo levado para essas longínquas paragens os usos e costumes do Burgo Caldense: jogo do ringue, bilhar, poker, lerpa, montinho, sete e meio, etc. Levaram também amor, expresso nas coladeras e rebentas, e amizade profunda pelos nativos, estabelecendo novas regras de comércio que depois se veio a tornar naquilo que agora chamamos globalização: tirava-se dos armazéns da tropa e vendia-se às gentes necessitadas.

A história talvez seja melhor ficar por aqui, penso que dei um contributo generoso dos hábitos da minha juventude lembrando heróis inesqueciveis,: Jorge, Tó, Tony, Asdrúbal, Abílio, Hélder, o inefável Rainho, Tinico, Artur Capristano, o Varela, o Figueiredo, o João (Traga-Balas), o João conhecido pelo João Pifão, o Honório Vaca Mansa, Cipriano o Caseiro, Morais Grandalhão, os craques Moura e Cardoso, Rui Importante, Rui Cospe Cospe, o Gang (Pedro,Xico,Samagaio e Pereirinha), o Quintas, o Lacrau, o Macela (campeão de Xadrez), o Rui da Cristina e tantos outros que não andaram no Colégio, mas foram compagnons de route de todas as personagens desta história. Por vontade própria omito os nomes das nossas colegas heroínas, pois passam por mim todos os dias na rua.
Bem hajam e lembrem-se do velho grito:

É jacaré? Não é.

É tubarão? Também não.

Então o que é? RAMALHO ORTIGÃO
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José Carlos Nogueira

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