ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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TEACHERS (Leonard Cohen)

A nova geração de professoras (1970/1972), por Isabel Xavier

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Em 1970 morreu António de Oliveira Salazar. Nesse mesmo ano o Papa Paulo VI recebeu os representantes dos Movimentos de Libertação das colónias portuguesas, houve manifestações contra a Guerra Colonial e foi criado o MRPP. No ano seguinte, 1971, as Universidades portuguesas contavam com a presença constante de forças policiais fardadas e à paisana. Em 1972, o estudante Ribeiro Santos foi morto a tiro pela DGS no interior das instalações da Universidade de Lisboa e foram presas cerca de 70 pessoas por se terem reunido na Capela do Rato em nome da Paz.

E no Externato Ramalho Ortigão, passar-se-ia algo de análogo? De que modo reflectiria esse “pequeno mundo” as transformações gerais que à sua volta, e designadamente no meio estudantil universitário, indiciavam o começo do fim da ditadura?

O director era o Padre Xico. As raparigas (e algumas professoras, segundo testemunhos prestados na primeira pessoa aqui no blogue) usavam mini-saia, maxi-saia ou calças; os rapazes deixavam crescer o cabelo e todos (menos eu) – rapazes e raparigas - fumavam desalmadamente, como se não houvesse amanhã, às escondidas, nas casas de banho do colégio. Mas, e este pormenor não é despiciendo, os rapazes mais velhos já eram autorizados a fazê-lo, durante os intervalos, fora das instalações do colégio. Vinham para junto do gradeamento do recreio das raparigas que se “penduravam”, conforme podiam, ao longo do dito (eu também).

Além das significativas mudanças já enunciadas, outro facto marcante dos novos tempos que se viviam no colégio, entre 1970 e 1972, foi a integração no seu Corpo Docente de uma nova geração de professoras, entre elas a Dra. Noémia e a Dra. Júlia, que leccionavam, aliás com competência inquestionável, respectivamente, as disciplinas de História e de Português.

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Cada uma à sua maneira, e por motivos distintos, se distinguiam dos professores a que estávamos habituados. Desde logo, pelo aspecto físico, a Dra. Noémia, que já tem aparecido em várias fotografias do blogue, tinha um ar arrapazado, andava sempre de calças; a Dra. Júlia usava brutas mini-saias, blusas decotadas e até mesmo de alças (ai se o Padre Albino visse...) e era um tanto “esgrouviada” de modos.



Depois, pelo modo como se relacionavam com os alunos. Mesmo eu, pouco dada a folias, me lembro de ter integrado um grande grupo responsável por um “assalto” de Carnaval a casa da Dra. Júlia. Dançámos, comemos, bebemos e lembro-me até de o Henrique Conceição, enquanto o Vasco Baptista se afastou por qualquer motivo, me ter vindo dizer com indiscutível convicção e uma voz algo arrastada: “Tu é que és boa rapariga, tu é que és mesmo boa rapariga!”. Valeu-me o Chico Carrilho que nos “separou”, ao mesmo tempo que dava razão ao Henrique. Fez bem, há certas ocasiões em que as pessoas não devem ser contrariadas, principalmente quando estão cobertas de razão.
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Já em casa da Dra. Noémia, a que também cheguei a ir com outros colegas, lembro-me de lá ouvir canções revolucionárias, as inconfundíveis músicas do cancioneiro anti-regime. Noutro registo, mas não menos interessante, lembro-me de ter sido aí que pela primeira vez ouvi Leonard Cohen, num disco levado pela Dra. Cármen, nossa professora de Inglês, deixando-me encantar (até hoje) pelos belíssimos poemas e melodias das suas baladas.

Alguém pensaria serem possíveis episódios destes em casa de professores do ERO? Sinais dos tempos!

- Isabel Xavier -


= "TEACHERS" Leonard Cohen =









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COMENTÁRIOS
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JJ disse:
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Não queria terminar esta série sobre os Professores sem assinalar a chegada ao Colégio de uma geração de professoras de "tenra" idade e pouca experiência lectiva no final da década de 60. Na minha memória é a Inês a primeira, depois a Ermelinda, Helena, Ana V Lino (apenas um ano, julgo), a Carmen, a Noémia e a Júlia. Estas três últimas trazem uma nova forma de relacionamento com os seus alunos, mais informal e que se prolongava fora do espaço do Colégio. Em casa da Noémia e da Nani, ali junto à Ponte, jogavam-se cartas e ouvia-se música diariamente, organizavam-se jantares e festas quase todos os fins de semana.

A Júlia morava ao pé do Convívio e era frequente encontrá-la a lanchar e conversar num dos cafés da praça. Era uma pessoa divertida, desinibida e bem disposta que falava pelos cotovelos e ria com facilidade e frequência

Eu frequentava a alínea F, não fui aluno de nenhuma delas, mas mantive esta convivência, que se prolongou, para mim, entre 1970 e 1972.
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O texto da Isabel é excelente, enquadrando bem a época e as caricaturas da São Caixinha; talvez por ter destas duas senhoras uma memória mais recente e de quando ela própria era mais velha, estão, na minha opinião, entre as suas melhores ilustrações nesta série. Mas há mais....
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Gostaria de saber o que é feito da Ermelinda (uma das melhores professoras que tive no ERO), da Helena, da Noémia e da Júlia. Alguém sabe?
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Isabel X disse...
Só para corroborar o que diz o Jales: as caricaturas da São estão simplesmente notáveis! Enquanto estive na faculdade (acabei o curso em 81) ainda vi algumas vezes a Dra. Júlia por lá. Depois, nunca mais! Também já me tenho perguntado: que será feito destas professoras?
- Isabel Xavier -
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João B Serra disse:
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Em poucas palavras, uma evocação sugestiva de uma época, com as suas personagens, estilos de vida, formas de relação, e com os seus ambientes: é assim que escreve a Isabel Xavier (e reconstitui pelo desenho a São Caixinha). Claro que também fala de si própria, mas com a sobriedade própria de quem historia o que testemunhou.
Nada tendo a acrescentar, só posso corroborar: em 1970 ingressou no ensino público e particular uma nova geração de professores. Eles tinham obtido um grau académico passando por cima de colegas que entraram antes na Universidade, pois foi em 1968 que o Ministro José Hermano Saraiva criou nas Faculdades de Letras e de Ciências o grau de bacharel. Eram realmente mais novos – dois anos em média – que os seus colegas licenciados e tinham apanhado em cheio as movimentações estudantis de Lisboa (1968) e Coimbra (1969). A geração do “rock” tinha agora a responsabilidade de fazer diferente na escola que tanto contestara.
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Julinha disse:
O artigo da Isabel está muito engraçado, gostei e fez-me lembrar um dito muito conhecido "chegou uma lufada de ar fresco" ao Blog!
Quanto aos desenhos da São, eu que não conheci nenhuma destas senhoras, parece que as estou a ver tal como a Isabel as descreve.Parabéns às duas meninas.Beijinhos. Júlia R
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Isabel Esse disse...
Está muito bom o artigo,como tem sido uma constante com a Isabel Xavier.Os desenhos da São estão estupendos,tem razão o Jales ao dizer que são dos melhores que ela fez!Conheci a casa da Noémia(e da Nani),era um sítio divertido,em que todos estavam à vontade.Lembro-me de lá ver a Lena,irmã da Isabel,a Fani,a Teresa Miguéis,a Zé Pereira,mas não a Isabel,que era mais nova.Lembro-me também de uma festa de Carnaval em 71 ou 72com o Henrique,Nuno Mendes,Jales,Hipólito,não sei se será dessa que falas?Beijos.Isabel
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Ana Carvalho disse:
Olá João
Não se pode uma pessoa ausentar durante 2 ou 3 dias e aparecem logo 2 excelentes textos no nosso blog.
Como sempre as caricaturas da São estão fantásticas e o texto da Isabel como sempre muito bem escrito. A drª Noémia e a Drª Júlia... que professoras fantásticas e amigas até, belas tardes que passámos em casa da Drª Noémia e Nani a jogar às cartas, a ouvir musica, a conversar.
Também eu fui ao assalto de carnaval, uma maravilha. Gostava de saber o que foi feito delas, tal como a Drª Inês talvez aparecçam aqui um dia destes. Bjs PP
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José Carlos Faria disse:
Consultar o blog após um período de ausência é um prazer sempre renovado. Desde logo porque há surpresas à espreita.
Desta vez foram os textos do Dr. Serafim e da Isabel Xavier. Sobre este último, o cruzamento, tão bem urdido, das memórias pessoais com os dados históricos, levou-me uma vez mais a compreender que as grandes transformações decorrem de uma sucessão de pequenas mudanças, por vezes imperceptíveis, mas que vão lentamente infiltrando raízes, abrindo brechas naquilo tido por supostamente impenetrável, até brotar a subtil planta do Novo, algo de substancialmente diferente do até aí vivido.
Também foi assim connosco: O Colégio, apesar da tendência imobilista e conservadora em que muitas vezes esteve mergulhado, não era (nem podia ser) uma ampola que nos isolava do Mundo e nos tornaria imunes e insensíveis aos tempos e ao soprar dos seus ventos. Éramos muito jovens num tempo (ainda) muito velho. O que estava para vir seria aliciante e inesquecível....
Quanto às duas recentes caricaturas que nos são oferecidas pela São Caixinha confirmam (se preciso fosse) o talento certo da autora e sendo particularmente conseguidas, fazem sobressair ainda mais uma colecção de grande qualidade.
Este nosso blog, a meu ver, já tem conteúdo que justifica começar a pensar numa antologia editada em suporte papel. As caricaturas são, desde logo, material a seleccionar. Z C Faria
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São Caixinha disse:
O texto da Isabel X sobre a Dra. Noémia e a Dra. Júlia está muito interessante!! E que excelente memória também!
As caricaturas a enquadrar este tipo de textos ficam naturalmente muito enriquecidas! Obrigada de qualquer forma pelas simpáticas palavras! Sabem sempre bem os elogios, tenho que admitir!
Concordo com o JCF ao referir que há material de qualidade suficiente para uma publicação em papel...pela abundância creio que haverá até alguma dificuldade na selecção de textos e comentários! Fico a aguardar o final da série!!

2 comentários:

Isabel X disse...

Só para corroborar o que diz o Jales: as caricaturas da São estão simplesmente notáveis! Enquanto estive na faculdade (acabei o curso em 81) ainda vi algumas vezes a Dra. Júlia por lá. Depois, nunca mais! Também já me tenho perguntado: que será feito destas professoras?
- Isabel Xavier -

Isabel Esse disse...

Está muito bom o artigo,como tem sido uma constante com a Isabel Xavier.Os desenhos da São estão estupendos,tem razão o Jales ao dizer que são dos melhores que ela fez!
Conheci a casa da Noémia(e da Nani),era um sítio divertido,em que todos estavam à vontade.Lembro-me de lá ver a Lena,irmã da Isabel,a Fani,a Teresa Miguéis,a Zé Pereira,mas não a Isabel,que era mais nova.Lembro-me também de uma festa de Carnaval em 71 ou 72com o Henrique,Nuno Mendes,Jales,Hipólito,não sei se será dessa que falas?Beijos.Isabel