No Casino além das salas de jogo, do bar e da sala de baile existiam dois espaços com nomes próprios: o "Céu de Vidro", a zona central com a cobertura em abóbada feita de vidros, e a “Aldeia dos Macacos”, a zona de esplanada aberta que confinava com o Parque. Como a Belão, eu nunca soube a origem desta designação, embora suponha estar ligada a ser um espaço onde a miudagem brincava enquanto os pais estavam no interior ou por ter sido uma zona nos anos 50 aberta a todos os veraneantes, enquanto o interior tinha o acesso reservado aos sócios.
O ritual das meninas a prepararem-se para os bailes era uma cerimónia interminável… Qualquer dúvida que se levantasse sobre a adequação de uma peça de vestuário, um adereço ou uma maquilhagem poderia arruinar horas de “trabalho” e atrasar irremediavelmente a chegada ao Casino. Essa hora de chegada era também estudada, já que não se podia chegar tão cedo que não estivesse lá ninguém nem tão tarde que já ninguém reparasse. Sendo de um sexo, nesse aspecto, mais afortunado, nunca passei por essas angústias.
A Belão não se lembra, mas fui o seu par num dos Bailes da Chita. Ficámos em segundo lugar devido aos habituais "jogos de bastidores", que nos retiraram a merecida medalha de ouro. O nosso Tango, espontâneo e inesquecível, levou a assistência ao rubro!
O boicote das várias eleições no Casino nos anos entre 69 e 73 era um passatempo que desesperava os “organizadores” desses eventos (Dr. Calheiros Viegas e D. Carlota Mendonça à cabeça).
A eleição de que a Belão fala foi a de Miss Praia em 1970, organizada pelo Jornal Capital: a vencedora da Miss Foz do Arelho tinha 120Kg, usava uma cinta sob o (amplo) bikini e dançou a valsa da consagração com a Mãe! O Rui Hipólito tinha 14 anos nesse ano, não foi ele o organizador dessa votação (essa memória, Belão…eu lembro-me quem foram os três autores, mas não digo!). A Capital pagou 5 contos à vencedora na condição de ela não aparecer na final, no Casino do Estoril. Como a segunda classificada (mulher do apresentador e que só concorreu para fazer número) exibia uma extensa cicatriz de uma “apendicite” algo deslocada e demasiado extensa, não houve mesmo representante da Foz na final. No ano seguinte a organização foi no Facho, em S. Martinho, com entradas rigorosamente controladas. Ainda lá fui mas, não me lembro bem porquê, não me deixaram entrar...
Recordo-me também de outra eleição, Miss Hot Pants, ganha por um Travesti com o nome “artístico” de Joana Lages, que provocou uma apoplexia no Dr. Calheiros Viegas, quando este descobriu que tinha espetado dois xoxos num homem ao entregar-lhe o troféu! Foi em 1971, mas também não vou aqui revelar quem era este “artista”. E há muito mais estórias, ficam para outra ocasião.
O Miguel B M relatou na sua crónica a vinda do Paulo de Carvalho, a Belão lembra aqui outros espectáculos. Nenhum deles recordou o Rui de Mascarenhas, que era uma presença assídua e um frequentador habitual.
Todas estas vedetas passaram pelo Casino pela mão do empresário Vítor Resende, que esteve a um passo de trazer a Shirley Bassey, um dos monstros da canção da altura, ao Casino, num concerto que seria televisionado. Foi em 1969 e falhou o apoio da Câmara, a quem faltou talvez a visão da importância do acontecimento. Outra estória que fica para outra oportunidade.
Só por curiosidade refira-se que as cantoras que a Belão refere tinham direito a uma cabeleireira privativa para a sua actuação. Apesar de cobrar um “cachet” mais baixo, a gorjeta da Hermínia a essa senhora foi dez vezes maior que a da Amália, acreditam?
Foi com uma versão entusiástica de Venus, dos Shocking Blue, que os Xaranga Beat “convenceram” o Zé Augusto a contratá-los para a sua primeira temporada no Casino (15 de Julho a 15 de Setembro de 1970).
Penso que sobre o Xaranga a autora conta tudo, faltou talvez mencionar o Rui Reis, pianista, de quem me lembro particularmente bem. Escreveu-me posteriormente a Belão: O Rui Reis (esqueci-me de falar nele) é na fase do Júlio Pereira, Patrício, Cavalheiro e Rui Venâncio.
Eu fiz amizade com o Rui porque era um dos membros da banda que mais e melhor conhecia os novos movimentos musicais ingleses e americanos. Lembro-me do entusiasmo com que tentou introduzir no reportório do Xaranga algumas músicas mais próximas de um Rock mais adulto e ambicioso que emergia na altura. "America" (Leonard Bernstein), conforme já mencionei anteriormente, foi um dos exemplos mas lembro-me de lhe fornecer letra, e gravações de muitas canções.
Deixei para o fim, por ser uma nota mais longa, a referência da Belão a “Joseph”, o primeiro single de Moustaqui como cantor, editado em 1968.
Georges Moustaqui chamou-se Joseph, Giuseppe e Yussuf Mustacchi, em diversos momentos. Eu explico: este francês, filho de grego e arménia nascido no Egipto, teve documentos com todos esses nomes! Na década de 50, já sediado em França, tornou-se conhecido como compositor ajudando as carreiras de, entre outros, Charles Trenet, Yves Montand , Juliette Gréco, Colette Renard, Pia Colombo, Dalida, Tino Rossi e Barbara. Ao compor "Milord" para Piaf em 1959, quando mantinha com ela um romance, tornou-se célebre. É cantado por Reggiani e Brassens nos primeiros anos da nova década. Mas só em 1968, durante uma tournée com Barbara, sua companheira na altura, acometida de uma doença súbita, foi “obrigado” a cantar em público. Um ano depois “Le Métèque” (estrangeiro, apátrida) torna-o uma estrela mundial.
Uma imagem de libertário utópico, fraternal e amigável, pregando a paz e harmonia universal torna-o irresistível para a geração de 60. Continua a cantar e dar espectáculos até hoje, com setenta e três anos de idade. A maioria dos seus álbuns chamam-se simplesmente “Georges Moustaqui”, para desespero dos seus inúmeros admiradores e coleccionadores, obrigados a usar o ano de edição ou o nome da primeira canção de cada um deles para os distinguir.
Tentei não me repetir em relação a algumas notas que já tinha escrito sobre o Casino a propósito do depoimento do Miguel B M. Quem não tiver lido pode ir a Notas e comentários a "Os Locais do Miguel B M"
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JJ
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