ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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Diário - 9 de Maio

Esta é mais uma página do Diário de um aluno do Externato Ramalho Ortigão. Esteve guardado num sótão muito húmido, tem a capa desfeita e o ano ilegível. Grande parte das folhas estão coladas umas às outras, muito amarelecidas e com a tinta esborratada. Estou a tentar transcrever as mais aproveitáveis e que tenham, simultâneamente, referências a locais de encontro e acontecimentos desse tempo. Os nomes dos locais foram fáceis de perceber, penso que estão correctos, os das pessoas não estou tão seguro. Pela primeira vez foi possível publicar numa data coincidente com a data original do Diário! Valeu a pena o esforço? Vocês me dirão. JJ


Oito e meia da manhã e pimba! ponto de Físico-Químicas. Repetiu-se a habitual correria para ir buscar folhas de ponto ao vestiário. É obrigatório ter uma sempre na pasta, mas a malta não se lembra. Se fosse a Cristina tínhamos um pé-de-vento, mas o Serafim fez de conta que não viu, acendeu um cigarrinho para dar tempo. Enquanto fizemos o ponto ele construiu um cinzeiro, dobrando uma folha de papel em forma de concha. As beatas foram meticulosamente esmagadas na borda do cesto dos papéis.

À saída a choradeira foi geral, correu mal a todos...A questão é que uns diziam a verdade e outros não. Mas nunca parece bem dizer que se estudou e que se sabia a matéria!

As duas horas de Desenho correram sem problemas, o Lopes dá sempre umas aulas porreiras e não faz nada para lixar a vida a ninguém.

As conversas no intervalo grande foram sobre o ano que está a acabar: “já viram a porrada de pontos que ainda temos este mês?” lembrou o Ricardo. E é verdade. Ainda outro de Físico-Químicas, um de Desenho e um Matemática. Filosofia nunca se sabe bem, mas pelo menos um há. E fala-se de dois a Ciências, sendo o segundo para recuperar (só se recuperava se ela deixasse somar as duas notas, mas não deve ser o caso…). Organização Política nem conta, as notas nunca são boas nem más, a matéria é intragável mas curta. Graças a Deus!

A campainha tocou para acabar o intervalo, fomos para a aula de Ginástica com o Bastos. Nesta altura e com bom tempo as aulas são óptimas, normalmente andebol ou futebol de salão no recreio. Já me esqueci das chatíssimas aulas dentro do ginásio. E dos sermões sobre a ginástica ser uma forma de preparar os machos para a guerra com os pretos e as fêmeas para parirem filhos saudáveis. Penso que a maior parte da malta nem percebe bem o que ele quer dizer. Mas alguns percebem, e não gostam de ouvir. Falei com o Raul e o Paulo há tempos sobre isso. Concordam comigo.

À hora de almoço vou a casa. O grupo do 31 depois de almoço do meu Pai mudou-se entretanto dos Capristanos para a Maratona, que eu agora evito a esta hora.

Escolhi tomar café na Zaira e cheguei a horas para a única aula da tarde. Às três e meia estamos livres! Algumas vozes falaram na necessidade de estudar. Mas a firme resolução do Paulo resolveu a questão: “à noite vamos para casa do Filipe e então é que é estudar a sério”. De consciência tranquila, abalámos para o Parque.

Tarde de sol e calor. Alguns agarraram uma mesa de Ping Pong, eu e o Mário fomos com a Luísa e a Mariana andar de barco. Indo com as miúdas não pudemos caçar cisnes nem molhar a malta dos outros barcos. Por isso a viagem foi pacata, embora o Mário fingisse duas vezes tropeçar ao trocar do leme para os remos: o barco balançou, as miúdas gritaram, agarradas aos bancos, o guarda ralhou do cais. O costume. Por 6 paus, foi meia-hora bem passada.

Ainda dei uns toques no Ping Pong mas o Mário não. Penso que tem medo de perder a mão para o Ténis, que vamos jogar ao princípio da manhã e ao fim da tarde durante o Verão... Que está quase aí, faltam só os malvados pontos!

O lanche foi no Machado. Eu era o único dos quatro que preferia uma imperial no Camaroeiro e perdi. Muitas senhoras, e alguns casais, ocupavam a maior parte das mesas. Para o mês que vem já não haverá vagas a esta hora. Nalgumas mesas os bules de chá parecem não fumegar. Dizem uns que é chá frio, outros que é vinho branco fresco que as senhoras bebem em chávenas. Só perguntando ou pedindo para provar é que se descobriria, mas não há lata para isso.

Vem um prato de bolos sortidos para a mesa, eu adoro mil-folhas e peço outro. É sempre uma confusão, porque vêm bolos que não queremos e se queremos dois iguais temos que trocar. Dividimos por quatro a despesa. O empregado ainda perguntou “as meninas também pagam?” e o Mário respondeu “ claro, também lancharam…”.

A Luísa e a Mariana foram para casa às seis horas, nós ainda fomos à procura do resto do maralhal ao Camaroeiro, Zaira, Marinto… Não encontrámos ninguém. Espreitámos o Central, em desespero. Nós habitualmente só vamos aos bilhares e ao Xadrez, na cave. Raramente ao Café, que tem um ambiente mais soturno que a Zaira, apesar das enormes janelas. Gosto de me sentar junto a elas a observar a Praça, mas de manhã, quando o Central é diferente e a Praça está cheia. Também lá não estava nenhum dos colegas.

Acabámos por saber que estavam na Maratona. Calha bem, cravei uma caderneta de senhas novas ao meu Pai. Cada uma dá direito a meia-hora na pista. E, se não houver ninguém à espera, fica-se sempre mais um pouco. Não foi o caso hoje ás sete da tarde! As seis pistas estavam ocupadas e havia muitos mirones. Vários colegas nossos estavam entre eles. Alguns colocavam-se junto às curvas mais apertadas para repor nos sulcos os carros que se despistavam. É uma forma de participar, os carros e a sua manutenção são caros (pneus, motores, carroçarias, transmissões). Não é para todos. De vez em quando enganavam-se na pista em que punham o carro. Resultado: o “condutor” via o seu bólide conduzido involuntariamente pelo parceiro do lado a travar na reta, depois acelerar e sair disparado na curva seguinte! Como janto cedo, vim-me embora sem me estrear.

Fui jantar a casa. Só no Verão será possível ir jantar fora uns filetes à Cristina, um bife (ou bacalhau à Brás) à Zaira ou um prego no prato no Camaroeiro. Sempre com umas coroas extras fornecidas pelos nossos pais, quando vão jantar a Peniche ou à Nazaré. Porque nem nós queremos ir, nem eles querem que nós vamos!

Pouco depois das oito tentei beber uma bica na Zaira. Estava quase vazia, só alguns casais comiam uns bifes nas mesas reservadas aos jantares, junto ao balcão. Escrevi que tentei porque o João, entretido com eles, não me ligou nenhuma… Ainda fui ao balcão, mas o patrão César precisa de espaço e o balcão é pequeno, fui corrido. Voltei a sentar-me, mais malta chegou, o João lá entendeu que já justificava a viagem e trouxe as bicas. Terá aproveitado a presença de um casal de turistas e somado a data ao preço das refeições na factura, sem que as vítimas reparassem? Um velho truque do Silva, que continua a pegar, mas só com os clientes mais distraídos.

Alguém relembrou a noite de estudo na cave do Filipe. Eu por mim não estava interessado, nunca consegui estudar em conjunto. Todas as tentativas acabaram em grandes touradas: King, lerpa, copos, telefonemas para casa de pessoas com nomes sugestivos, nunca estudei nada. Mal por mal decidi ficar mais um bocado na rua e depois ler qualquer coisa de Ciências em casa, antes de me deitar. Mas alguns entusiastas arrancaram, saberei amanhã como correu. “As olheiras serão muitas e a sapiência pouca”, disse o Paulo, que ficou comigo.

Ainda fomos a uma sessão de tacho no Camaroeiro. Com a casadela a dez tostões dá uma média de quinze, vinte paus por jogo. Cada vez que o Sr. Júlio aparece, o dinheiro tem que ser escondido. Ganhei o último jogo e salvei a noite.

O Paulo mora mais longe e fez-me companhia até casa. Queixa-se da Aida, nunca sabe o que ela quer nem como espera que ele se comporte com ela. Digo-lhe que o meu tio me ensinou que o principal é mostrar-lhes quem manda! O conselho deve ser bom mas nunca consegui pô-lo em prática...

São complicadas as raparigas, com as sua mania que são mais maduras do que nós. Cheias de regras e nove horas umas vezes, repentina e assustadoramente aventureiras noutras. E todos os rapazes, quando em grupo, mandam bocas, são muito experientes e sabidos. Mas quando, a sós, fazemos perguntas concretas, ninguém sabe explicar nada. Nem os riscos que corremos, nem como os evitar… Também não soube o que dizer ao Paulo...

E agora vou dormir. Nem uma linha do livro de Ciências consegui ler. Vai ser uma desgraça...
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COMENTÁRIOS

    • Maria Manuela Gama Vieira Adorei!!!
      Personagens com nomes fictícios ou não...à excepção do nome dos Professores de Física,Ciências e Ginástica(este penso que não é do meu tempo),quase arrisco dizer que imagino quem é o autor desta página do diário.
      Valeu a pena o esforço,sim senhor!
      Muitos parabéns,Autor....:-)
      Pereira da Silva disse...
      ...esta estória cheira-me familiar...é notório que é um ambiente dum aluno do 6º ano...no 7º as preocupações já deveriam ser com os exames...as lancharadas e respectivos locais também são uma pista importante, sobretudo a cena do sovina, muito mais à Miguel...o grupo do 31 era famoso até porque ocupava algumas quatro mesas que ficavam reservadas cedo...lembro-me de algumas das personagens...Capristano, Abílio Flores e penso que o Dr Jales entre outros que deveriam ser para aí uns 10...a cena do Bastos, que eu não me lembro de ter ouvido, também foi sempre comentada no nosso grupo...só não consigo lembrar-me de nenhuma cave...havia era o sótão do Flores onde, na preparação das frequências desse ano, fizemos 4 directas seguidas...eu, Flores, Vitor Gil, Pedro Nobre, Rogério...e mais uns quantos maduros...todos tocados a café e cigarros...e a história duma célebre e velha cafeteira que nos esquecemos de despejar dos "alívios"....anda lá JJ, abre o livro e confessa-te

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12-05-2008
Júlia Ribeiro disse:
Desconheço o dono do baú que contém esta Reliquia,mas dá para perceber que na altura teria sido "alguém" muito bom aluno de Português.Que pena nesse dia não ter havido aula para sabermos o Professor que teve o prazer de ter tido tal aluno.....talvez eu ainda conhecesse ,pois os referidos conheçi muito bem,e estou plenamente de acordo. Senti-me maravilhada a ler;li e reli.....revi-me no colégio, a correr naquele corredor,a subir devagarinho as escadas para a aula,a descer a correr para o recreio para iniciar ou terminar o jogo " ao mata "que tinha ficado a meio no intervalo anterior,correr a ir comprar a bola de Berlim quentinha (acabadas de chegar) ao vestiário, com a Menina Alda numa azáfama a atender toda a gente!E que tristeza quando não chegavam para todas as gulosas....... Belos tempos!!!!!!!!!! E agora abençoada tecnologia que nos permite revivê-los com esta intensidade.Será que os nossos filhos daqui a uns anos terão as mesmas vivências,lembrar-se-ão tão bem como nós dos bons momemtos e locais de encontro por onde passaram nos bancos de escola ????Parabéns ao dono do baú e obrigado por me ter proporcionado voltar com este entusiasmo ao ERO.Júlia R
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12-05-2008
Luisa disse:
Como comentei no outro diário os nomes das pessoas não estarem correctos significa que estão alterados! (...) Assim não descobrimos a q turma é q pertence o escritor.E acho mal n ter tido resposta porque JJ sabe isto de certeza! Desabafo à parte é um prazer ler estas linhas, li 3 vzs seguidas...L
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12-05-2008
JJ disse:
Respondi à Luisa, na altura, o mesmo que respondo hoje: os nomes das pessoas poderão não estar correctos mas tudo o resto está (acontecimentos, aulas, professores, locais), dentro do que é possível saber. Fiquei satisfeito pelo "é um prazer ler estas linhas", que interpreto como uma forma de responder sim à minha pergunta se valeu a pena o esforço de recuperação do texto. JJ
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12-05-2008
Luis disse:
9 de Maio corresponde : 1965-domingo/1966-2ªFeira/1967-3ªFeira/1968-5ªfeira/1969-6ªFeira e 1970-sábado , podem confirmar em: http://www.fi.edu/time/Journey/OnceUponATime/dayofweekbirth.htm
66 não há maratona nem camaroeiro,em 70 não pode ser porque é sábado. Só é possível 67,68 ou 69. Não há tanta gente na alínea F (Física,Matemática,Ciências) no ERO nesses anos, tem que ser fácil saber quem é o "herói!"!
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17-05-2008
Isabel Maria disse:
(...) por tudo isto não parece possível isto ser uma entrada do diário e sim um aproveitamento de várias passagens dele. E é verdade, como diz a Júlia - que não conheço - que nos faz voltar a um tempo de felicidade. Obrigado por isso ao autor seja ele quem for. Isabel
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  • Júlia Ribeiro
    Claro que valeu a pena.....,adorei ! Parabéns ao Autor ....!

1 comentário:

Pereira da Silva disse...

...esta estória cheira-me familiar...é notório que é um ambiente dum aluno do 6º ano...no 7º as preocupações já deveriam ser com os exames...as lancharadas e respectivos locais também são uma pista importante, sobretudo a cena do sovina, muito mais à miguel...o grupo do 31 era famoso até porque ocupava algumas quatro mesas que ficavam reservadas cedo...lembro-me de algumas das personagens...Capristano, Abílio Flores e penso que o Dr Jales entre outros que deveriam ser para aí uns 10...a cena do Bastos, que eu não me lembro de ter ouvido, também foi sempre comentada no nosso grupo...só não consigo lembrar-me de nenhuma cave...havia era o sótão do Flores onde, na preparação das frequências desse ano, fizemos 4 directas seguidas...eu, Flores, Vitor Gil, Pedro Nobre, Rogério...e mais uns quantos maduros...todos tocados a café e cigarros...e a história duma célebre e velha cafeteira que nos esquecemos de despejar dos "alìvios"....anda lá JJ, abre o livro e confessa-te
Zeca