por Luis Flores Santos
Flores e Zé Neto
Estou simplesmente fascinado com o magnífico artigo do Luís Marcelino!
Não podia imaginar que quarenta anos depois, através de um retrato tão preciso e sensível, se tornaria presente a imagem da Drª Cândida num testemunho tão genuíno quanto impressivo do nosso amigo Luís António.
Subscrevo a substância e admiro a forma como ele me fez regressar de novo a uma época tão marcante para todos nós. Estimulado pela evocação do Dr Luís, não resisto a contar uma experiência surpreendente que vivi no início das férias grandes seguintes à conclusão do 3º ano.
Estávamos por isso em 1967 e o nosso inglês tinha os pilares assentes numas centenas de tiras de papel com cinco frases, cortadas artesanalmente de folhas A4, distribuídas em cada aula ao longo do primeiro ano da disciplina.
No prédio contíguo à casa dos meus pais existia ainda o Museu de equitação e toureio Joaquim Alves, obra notável do saudoso Dr Paulino Montez que com tenaz dedicação o manteve vivo até ao limite das suas forças. Segundo creio, o espólio acabou por ser doado à autarquia, tendo-se-lhe perdido o rasto!
A este propósito, devo dizer que não sou apreciador da arte e tenho mesmo algumas reservas em relação a certos valores que lhe estão subjacentes. Mas o Museu Joaquim Alves tinha um acervo vasto e valioso, reunido ao longo de décadas com laborioso empenho do seu promotor, não deixando de ser, à sua escala, um espaço de cultura que merecia ser preservado. Talvez esteja mal informado, ou mesmo a conjecturar injustamente, mas tudo me leva a crer que os esforços que o Dr Paulino Montez fez em vida para que não se perdesse o seu trabalho foram totalmente inúteis e manifestamente incompreendidos.
Mas voltando ao tema, numa tarde de um Sábado soalheiro quando saía de casa, deparo-me com uma figura de um homem estranhamente alto, cuja atitude identifiquei de imediato como mais um dos forasteiros que, com frequência, rondava a zona procurando o museu que em geral estava fechado. Nesses casos costumávamos tentar contactar o Dr Paulino Montez que comparecia, passados poucos minutos, para iniciar mais uma viagem pelas memórias do tempo tauromáquico, expostas ao longo das cerca de 8 salas totalmente repletas de cartazes, fotografias, vestuário, farpas, capotes, muletas e centenas de outros objectos, cada um com a sua mensagem precisa, premiando o esforço de quem procurara a visita.
“Do you speak english”? Ouço numa pronúncia inovadora, mas que me impeliu mecanicamente a responder: “Yes, I do”! Mal eu sabia que ia ser confrontado com a maior prova da competência de um professor que alguma vez tinha experimentado!
Richard Earl Perry Cone, mais tarde simplesmente o meu amigo Dick Cone, era um americano de Los Angeles que já visitara Portugal outras vezes, procurando desta feita visitar o museu do qual ouvira falar não sei como. Na excitação dos meus 13 anos e imbuído da natureza prestável atribuída aos portugueses, ainda por cima podendo exercitar o meu incipiente inglês, apressei-me a encontrar o Dr Paulino Montez que, como de costume, compareceu prontamente para novo périplo taurino.
Julgava aí terminada a minha missão, mas enganava-me. Creio que o Dr Montez não dominava a língua (à distância de quatro décadas é pelo menos essa a justificação que me satisfaz) e vejo-me então catapultado para guia de língua inglesa num museu de equitação e toureio, tema associado a um léxico técnico de grande extensão, àcerca do qual o meu conhecimento era rigorosamente nulo!
Ainda hoje não sei como circulei por aquele espaço hermético, exprimindo-me com desinibida desfaçatez, “traduzindo” as dicas que o Dr Paulino me transmitia em frases construídas a partir do vocabulário adquirido ao longo de um ano nos recortes de cinco frases do Dr Luís. Sei apenas que o Dick manifestava assertiva compreensão pelo meu esforço e o feito mereceu destaque no meu curriculum durante muitos anos, até se instalar no baú das memórias de infância como uma das glórias mais nobres de aluno do Ramalho Ortigão.
Nesse dia compreendi que, para além do prazer da aprendizagem que aquele professor tinha trazido para as nossas aulas com o seu método revolucionário e a sua técnica para estimular uma saudável competição entre nós todos, ele nos estava sobretudo a preparar para a vida.
Durante vários anos troquei correspondência com Dick Cone que me enviava regularmente informação em inglês sobre os mais variados temas. Chegou a oferecer-me uma assinatura da saudosa revista “Life”, até que as voltas da vida acabaram por me fazer perder o seu contacto, o que lamentei especialmente quando tive oportunidade de visitar Los Angeles e não o soube encontrar.
Obrigado Dr Luís por nos ter dado a oportunidade de aprendermos consigo.
Obrigado Luís António por me teres estimulado o despertar dessa agradável memória.
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LFS
LFS
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As fotografias são da colecção do Padre Xico
e escolhidas por mim para ilustrar o artigo. JJ
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COMENTÁRIOS
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Ana Carvalho disse:
Que rapazinhos tão jeitosos que estão na foto, uns autenticos galãs! Ainda não existia a Coca-Cola em Portugal senão decerto que os contratava para um anúncio! Flores, que texto excelente, tu sempre escreveste bem, se bem me recordo. Volta sempre, é um prazer ler o que escreves.
Aparece mais vezes.Bjs PP
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Flores disse:
Creio que nunca tinha visto estas fotografias, que se referem ao nosso primeiro acampamento no Bom Sucesso, com o Padre Xico.
Talvez venha a ser também um tema para evocar em ocasião com mais tempo.
Abraço
Talvez venha a ser também um tema para evocar em ocasião com mais tempo.
Abraço
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Luisa disse:
Como já disse antes fui aluna do Luis que considerei um excelente professor. Considero estes dois textos excelentes testemunhos e uma confirmação da minha opinião. Aproveito para cumprimentar os dois autores(só me lembro do Flores)porque estão ambos escritos de forma a enaltecer o Colégio onde estudaram!
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AntMor disse...
As fotografias são fantásticas,o Flores e o Malinha escrevem muito bem,onde vai parar este blogue???E o que é feito do Tó Zé Neto que parece uma estrela do surf dos anos 60???O Luis e a Cândida eram Grandes professores,assino essa declaração.
As fotografias são fantásticas,o Flores e o Malinha escrevem muito bem,onde vai parar este blogue???E o que é feito do Tó Zé Neto que parece uma estrela do surf dos anos 60???O Luis e a Cândida eram Grandes professores,assino essa declaração.
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João Jales disse:
A grande qualidade dos textos do Flores ficou bem patente nas suas colaborações iniciais neste Blog, lembro-me bem que ele foi um dos primeiros a não "recear" partilhar as suas memórias e a fazê-lo de uma forma muito original.
Além de todos os méritos que lhe apontei, o depoimento anterior do Luis António teve também o de provocar esta resposta, além de um comentário do também "reaparecido" Tó Zé Hipólito.
Como se vê, se a "malinha" do Luis António tem muito que contar, o Flores não tem menos "contas" no seu rosário (a seu tempo saberão ao que me refiro).
Um abraço aos dois Luises . JJ
2 comentários:
Como já disse antes fui aluna do Luis. que considerei um excelente professor.Considero estes dois textos excelentes testemunhos e uma confirmação da minha opinião. Aproveito para cumprimentar os dois autores(só me lembro do Flores)porque estão ambos escritos de forma a enaltecer o Colégio onde estudaram!Luisa
As fotografias são fantásticas,o Flores e o Malinha escrevem muito bem,onde vai parar este blogue???E o que é feito do Tó Zé Neto que parece uma estrela do surf dos anos 60???
O Luis e a Cândida eram Grandes professores,assino essa declaração.
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