ALMOÇO / CONVÍVIO

ALMOÇO / CONVÍVIO

Os futuros almoços/encontros realizar-se-ão no primeiro Sábado do mês de Outubro . Esta decisão permitirá a todos conhecerem a data com o máximo de antecedência . .
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A MINHA TERRA por Francisco Cera

Francisco Cera



A terra onde eu cresci

Era muito diferente

Daquela em que vivo agora.

Das saudades que senti

Desse lugar, dessa gente,

De onde tudo foi embora,

Não será fácil de escrever

Mas vou ter que o fazer,

Num texto breve, mas profundo,

Para que os novos possam sentir

Que não estou a mentir

Quando lhes digo

(Para meu castigo)

Que a minha terra

Era a melhor terra do mundo.




E tudo começava no Parque. Primeiro nos baloiços, no escorrega, nas matinés de “cobóis” do Ibéria, depois no pingue-pongue da Casa dos Barcos com a D. Adelaide a dizer “tá na hóia”, ou ainda, na Esplanada, com a malta à volta da máquina de discos a ouvir os primeiros acordes dos Beatles. À noite, o Parque enchia-se de encantos: os canteiros iluminados, a Banda a tocar, os mais velhos a passear e os mais novos, eles e elas, cruzando olhares e risinhos discretos. Muito discretos.

Ao cimo brilhava o Casino, fronteira do Tempo e da Condição, que se abriu de forma saudável a uma frequência enriquecedora.

A malta, se não estava junta, não estava longe. Havia sempre um sítio para se encontrar. A Rua das Montras, em frente à Tália, era um dos primeiros “pontos de encontro”. Lá de dentro vinham os novos sons, os novos cantores, e na rua parava, por pouco tempo, essa raridade geradora de felizes expectativas, as miúdas. A esquina da “Vaultier” era a sede da SAPEC (Sociedade Anónima de Polidores de Esquina Caldenses) e por lá paravam outros “mirones”.

Na fase mais imberbe, a malta espalhava-se pelos matraquilhos na Floresta, pelo bilhar do Marinto ou por um pires de berbigão no Caldas Bar por quinze tostões a dividir por três. Nesse tempo, no Silva Santos, a montanha paria um caderninho por cinco tostões, que era o preço de uma jeropiga ali para os lados do Chafariz das 5 Bicas. A malta alternava: umas vezes o caderninho, outras vezes a jeropiga.

O tempo das borbulhas decorria já nas tertúlias do Bocage, do Invicta ou do Lusitano. Para o Central já se exigia outra estaleca cultural que o Tempo se encarregou de trazer e permitir uma consciência que a todos, ou quase, acompanhou pela vida fora.

A Zaira, o “Poço das Víboras”, era reserva para o charme, o galanteio, a finesse.

Tinha de tudo a minha terra. Sobretudo, tinha Vida.

Tinha o Ferro Velho e a Azenha onde havia copos e paixão mas sem violência, cultura e mistério mas sem drogas, por vezes Zeca Afonso e a PIDE à porta. E tinha teatro, tinha o CCC que ganhava os prémios do SNI e enchia as salas de Lisboa, de Coimbra, eu sei lá…

Era um tempo de vivência no colectivo. No Carnaval, saltava-se dos Pimpões para os Bombeiros, do Casino para o Lisbonense até que a manhã chegasse e parasse a festa.

O Verão trazia gente de fora que se fez de cá e aqui compartilhava as festas, os jogos, os passeios, as brincadeiras no areal da Foz, umas imperiais no Zé Félix ou o Pôr-do-sol nos terraços da FNAT.

A minha terra tinha de tudo. Hoje tem apenas a saudade.


Francisco Cera

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