Não há razão para quaisquer justificações da tua parte e eu publiquei a crónica porque achei que devia ser publicada. As minhas reticências tinham a ver com o tamanho do texto, um pouco extenso demais para o habitual neste espaço.
Não pensamos de forma diferente em relação ao Padre Albino e aceito mais ou menos por inteiro os factos como os referes, mas não me revejo no Colégio que descreveste. Circunstâncias pessoais e familiares diferentes, formas de pensar e agir distintas, fazem-nos ter imagens e emoções diferentes na sua evocação. Eu nunca fui, por exemplo, fisicamente castigado por ninguém, Albino incluído.
Tenho, das regras que descreves, a recordação da permanente transgressão: namorei abertamente meia-dúzia de colegas a partir do 3º ano, ladeira abaixo e acima, mais dissimuladamente no Anfiteatro e na Biblioteca (tantas vezes aberta e sem ninguém a tomar conta,deviam pensar que ninguém lá ia...), até no confessionário nos intervalos em que não havia missa. Fui sujeito a um processo disciplinar por ser visto a sair da Mata à hora de almoço com uma colega e a única coisa que obtiveram foi a afirmação do meu Pai que ficava satisfeito por me saber um adolescente normal. Eu e outros fumámos nas casas de banho, no recreio e a meio dos corta-matos do sempre entusiástico Silva Bastos, enquanto os "atletas" subiam a Rua dos Loureiros. O Flores chegou a fumar dentro da sala de aula, acredita, enquanto o Miguel travava verdadeiros combates de luta livre com os colegas sentados na carteira à sua frente (desgraçados Silvestre e Rui Malaca). O Manuel Nunes ouvia relatos de futebol com um rádio portátil e auscultadores (caro o pagou depois...). Era uma festa.
Saí todos os anos no intervalo grande da manhã, sob pretextos vários, como ir buscar livros e cadernos esquecidos em casa, para me ir empanturrar de pastéis de nata quentes "cravados" à minha Mãe e às amigas que tomavam, a essa hora, café na Zaira. Lembro-me do Tó Zé Hipólito como companheiro entusiasta dessas excursões.
O meu cabelo e o do Rui Ferreira da Silva eram um alvo constante da atenção do Director. E acumulavam-se as desculpas para não o cortar, falta de tempo por ter muito que estudar, os pais não terem dado dinheiro para o efeito, barbearias muito cheias, "se o Sr Padre quiser eu vou hoje, mas tenho que faltar à aula de Ciências…". Era um jogo de gato e rato em que o gato ganhava sempre mas o rato tinha os seus momentos! E havia sempre as camisas às flores e com folhos, o lenço colorido atado ao pescoço (eu e o Rui, sempre os mesmos), os colarinhos à Mao, as camisolas cor–de-rosa, às riscas e com desenhos, tudo transgressões (?) que deixavam o homem à beira de um ataque de nervos. Do outro lado do muro a Anabela travava a mesma batalha, mas com o comprimento das saias e, ou a idade já me atraiçoa ou não me lembro de as ver com saias compridas... Emoção a rodos em embates desiguais, mas em que vendemos sempre cara a derrota.
Dos contínuos e das suas queixas resultou um dos três dias de suspensão a que tive direito. Por descobrir um método para fechar as portas das retretes por fora não ficando ninguém lá dentro, vê lá o crime! Eram uns pobres diabos, não lhes guardo qualquer rancor.
Não tenho idéia de sentir qualquer terror nas aulas do Azevedo, mas admito que era bom aluno e visita assídua de casa dele. Talvez por isso, sofria mais o filho dele e meu colega de turma, o Zé Luis, do que eu. E lembro-me com carinho do Padre Renato(Português, Canto Coral e Desenho) um dos melhores homens que conheci e que há 40 anos nos deixava fazer pequenos teatros no meio das suas aulas(eu, o Zequinha e o Flores); a surpresa das aulas informais do Lopes (Matemática, Geometria Descritiva e Geografia, ainda um dia hei-de falar dessas aulas de Geografia), do entusiasmo contagiante da Ermelinda (será este o nome?) que no 4º e 5º Ano me fez apaixonar pela História e me tentou ensinar a fazer uma composição, começando logo por me dar Medíocre num exercício piegas e lastimável que eu fiz sobre (imagina!)"A Saudade". Tinha a mania que sabia escrever… fez-me bem! (se ela me lesse agora, classificar-me-ia na mesma?). A dedicação e o empenho do Serafim(Matemática e Fisico-Química), grande professor, e a absoluta inabilidade da nossa querida Super para dar Filosofia, ela gostava era de História, com terra nas mãos e nas botas (e de um bom petisco ao almoço). Devo o que sei de Francês à Cândida e de Inglês ao marido, o Luis ; um pouco também à Inês, de quem tenho uma foto num magusto e uma boa recordação , apesar da injusta expulsão de uma aula dela me ter valido também outro dia de suspensão. Foi uma espécie de acumulação de "cartões amarelos", tendo sido corrido de quatro das seis aulas a que assisti numa malvada quinta-feira de Abril. Como nos corria quente e rápido o sangue nessa altura do ano, éramos certamente insuportáveis!
Mas estas doces recordações não tornam menos abominável a Madame Inc.(lembras-te da Cristina? essa sim, merecia uma crónica de terror), menos monótonas as aulas da Nicole e do Albino (quem lhes disse que podiam ser professores?), nem me recordam outras eventuais nulidades que já esqueci.
Lembro-me de um tempo em que fui feliz, de Invernos com poucas preocupações e muitos amigos, festas, namoradas, música (todo o dinheiro que arranjava era para LPs na Tália), futebol, fins de tarde na Zaira, Camaroeiro ou esplanada do Parque, serões loucos a “estudar” em casa dos que tinham sótãos ou caves mais reservados (lerpa, king, algum álcool e os primeiros cigarros), matraquilhos na Floresta e bilhar no Central. E, a seguir, 3 meses com os gostos e desgostos dos amores de Verão, praia de manhã, ténis ou cartas à tarde e Casino ou Ferro Velho à noite. Há lá Albino que estrague isto?
Os nossos quadros têm os mesmos motivos mas as cores são diferentes.... Quem tem razão? Os dois, claro. E é por isso que ambos os testemunhos fazem falta no Blog.
Um abraço
JJ
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comentários:
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11Dezembro , 2007
Alguém disse :
Classificação: Muito Bom
Guidó
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11 Dezembro, 2007
JJ disse:
Na ausência da Dra. Ermelinda, vou usar a tua classificação. Mas ela não seria tão complacente, tenho a certeza.
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11 Dezembro, 2007
Filipe disse...
Desculpem a intromissão de alguém que não andou no Ramalho Ortigão mas sim na Escola Industrial e Comercial, escola esta que fez muito mais do que que propiciar a possibilidade de honradamente os seus alunos terem emprego.Sendo o vosso blog público não levarão seguramente a mal o meu comentário.Nao vivi o ambiente do colégio mas convivi com alguns alunos ao tempo, e sinceramente nunca me apercebi de uma imagem tão negativa como o Faria transmite no seu texto. Talvez não seja essa a sua intenção nem o seu sentimento, mas parece-me existir alguma mágoa interiorizada a que ainda não conseguiu fugir.Revejo-me muito mais na imagem que o Jales transmite.
O v/blog está excelente, os meus parabéns.
Filipe Domingos
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11 Dezembro, 2007
E.R.O. disse:
É com ENORME prazer que acolhemos este comentário de um aluno de uma Escola onde sempre tivemos muitos amigos , apesar da existência de uma saudável rivalidade. E os magustos e festas da Escola Comercial, podemos reconhecê-lo hoje, eram muito mais divertidos que os do Colégio!
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12 Dezembro, 2007
Miguel B M disse:
Uma palavra sobre o comentário feito pelo aluno da escola.E é bom que elementos estranhos ao ERO mas nosos contemporâneos e com quem convivemos dêem a sua visão sobre aqueles tempos.É claro que nada transparecia para o exterior.Mas nós éramos jovens, despreocupados, visionários, e vivíamos a vida intensa e alegremente. E a rivalidade que havia com a escola era só nas diversas competições desportivas.Quanto ao mais apreciávamos imenso o convívio com os colegas da escola e especialmente com os borrachos que eram muitos e muito simpáticos.
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Dezembro 13, 2007
Alguém disse:
…..este texto é doce como hidromel, viciante como ópio e tóxico como absinto …. não sei se continue a ler a noite toda ou se deixe de vir ao blogue antes que fique dependente ….. Luisa
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Dezembro 13, 2007
JJ disse:
Se não desconfiasse que esta Luisa é um Luis travestido, ainda lhe dava o meu nº de telefone. Mas vivemos tempos duvidosos ...
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Dezembro 13, 2007
Miguel B Monteiro disse:
Em relação ao artigo do JJ subescrevo-o na totalidade.Felizmente a maioria das coisas que aconteceram foram boas e devemos recordá-las.Ainda para mais o JJ escreve cheio de nostalgia a que não posso ficar indiferente,senão sensibilizado.
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